domingo, 25 de março de 2012

A Glândula Pineal, Corpo e Alma, Mediunidade, 4ª dimensão...

Como dissemos nas publicações Xamanismo, e Sun Gazing - a Medicina Gratuita do futuro, há nesses tempos bicudos mas fascinantes em que estamos vivendo, uma ocorrência  cada vez maior da figura do pontífice, ”pessoas que estabelecem a ponte entre tipos diferentes e isolados de conhecimento, cultura, dimensões, mundos”. 
Uma dessas figuras é, sem dúvida o Dr. Sérgio Felipe de Oliveira. psiquiatra e mestre em Ciências pela Universidade de São Paulo, Diretor-clínico do Instituto Pineal Mind e diretor-presidente da AMESP (Associação Médico-Espírita de São Paulo), É um dos maiores pesquisadores na área de Psicobiofísica da USP, principalmente sobre do papel da glândula pineal  na ligação com o espírito, via mediunidade.
Por uma dessas sincronicidades, tivemos o prazer, após publicar neste blog (veja lá) um vídeo sobre sua bem humorada palestra a respeito da pineal, de conhecer e conversar com a simpática figura, numa reunião sobre a nova educação que está brotando no mundo. Como muitos outros, ele ajuda a estabelecer uma ligação coerente e sólida entre Ciência e Espiritualidade, Corpo e Alma, o Concreto e o Invisível, enfim, uma volta ao lugar de onde não deveríamos ter saído.

Um pequeno órgão despercebido, em forma de pinha, do tamanho de um grão de bico, no meio da cabeça entre os dois lobos cerebrais, a glândula pineal surge como o centro de nosso relacionamento misterioso com outras dimensões, e tem sido assim nas mais variadas correntes religiosas e místicas, há milhares de anos. 
O mistério não é recente. Há mais de dois mil anos, a glândula pineal, ou epífise, é tida como a sede da alma. Para os praticantes da ioga, a pineal é o ajna chakra, ou o “terceiro olho”, que leva ao autoconhecimento. O filósofo e matemático francês René Descartes, em Carta a Mersenne, de 1640, afirma que “existiria no cérebro uma glândula que seria o local onde a alma se fixaria mais intensamente”.
Atualmente, as pesquisas científicas parecem ter se voltado definitivamente para o estudo mais atento dessa glândula. Estaria a humanidade próxima da comprovação científica da integração entre o corpo e o que se chamaria de alma? Haveria um órgão responsável pela interação entre o homem e o mundo espiritual? Seria a mediunidade, de fato, um atributo biológico e não um conceito religioso, como postulou Allan Kardec?
Para responder a estas e outras perguntas, a revista Espiritismo & Ciência conversou com o Dr. Sérgio Felipe de Oliveira.
Revista: - Fale um pouco sobre seu trabalho à frente da AMESP e do Instituto Pineal Mind.
Sérgio: - A AMESP é uma associação de utilidade pública que reúne médicos dedicados ao estudo da relação entre a medicina e a espiritualidade. O Pineal Mind é minha clínica, um instituto de saúde mental, onde fazemos pesquisas e atendemos psicoses, síndromes cerebrovasculares, ansiedades, depressão, psicoses infantis, uso de drogas e álcool. Temos um setor de psiconcologia (psicologia aplicada ao câncer) e estudamos também os aspectos psicossomáticos ligados à cardiologia, etc. Agora, particularmente nas pesquisas comportamentais, eu estudo os estados de transe e a mediunidade. Mas não pesquiso só a glândula pineal; ela é o que eu pesquiso no cérebro, interessado em entender a relação entre corpo e espírito.

- O que é psicopbiofísica?
- É a ciência que integra a psicologia, a física e a biologia. Na biologia, estudamos o lobo frontal, responsável pela crítica da razão; mas o cérebro funciona eletricamente – aí entra a física, que serve de substrato para o pensamento crítico, que é o psicológico.
- Quando surgiu seu interesse no aprofundamento do estudo da pineal?
- Foi por volta de 1979/80, quando eu estava estudando a obra de André Luiz, psicografada por Chico Xavier. Em Missionários da Luz, a pineal é claramente citada. Nesta mesma época, eu já pleiteava o curso de Medicina. No colégio, estudando Filosofia, fiquei impressionado com a obra de Descartes, que dizia que a alma se ligava ao corpo pela pineal. Quando entrei na faculdade, corri atrás destas questões, do espiritual, da alma e de como isso se integra ao corpo.
- O que é a glândula pineal, onde está localizada e qual a sua função no organismo?
- A pineal está localizada no meio do cérebro, na altura dos olhos. Ela é um órgão cronobiológico, um relógio interno. Como ela faz isso? Captando as radiações do Sol e da Lua. A pineal obedece aos chamados Zeitbergers, os elementos externos que regem as noções de tempo. Por exemplo, o Sol é um Zeitberger que influencia a pineal, regendo o ciclo de sono e de vigília, quando esta glândula secreta o hormônio melatonina. Isso dá ao organismo a referência de horário. Existe também o Zeitberger interno, que são os genes, trazendo o perfil de ritmo regular de cada pessoa. Agora, o tempo é uma região do espaço. A dimensão espaço-tempo é a quarta dimensão. Então, a glândula que te dá a noção de tempo está em contato com a quarta dimensão. Faz sentido perguntarmos: “Será que a partir da quarta dimensão já existe vida espiritual?” Nós vivemos em três dimensões e nos relacionamos com a quarta, através do tempo. A pineal é a única estrutura do corpo que transpõe essa dimensão, que é capaz de captar informações que estão além dessa dimensão nossa. A afirmação de Descartes, do ponto em que a alma se liga ao corpo, tem uma lógica até na questão física, que é esta glândula que lida com a outra dimensão, e isso é um fato.
- Outros animais possuem a epífise? Ela está relacionada à consciência?
- Todos os animais têm essa glândula; ela os orienta nos processos migratórios, por exemplo, pois ela sintoniza o campo magnético. Nos animais, a glândula pineal tem fotorreceptores iguais aos presentes na retina dos olhos, porque a origem biológica da pineal é a mesma dos olhos, é um terceiro olho, literalmente.
Esta glândula seria resquício de algum órgão que está se atrofiando, ou estaria ligada a uma capacidade psíquica a ser desenvolvida?
Eu acredito que a pineal evoluiu de um órgão fotorreceptor para um órgão neuroendócrino. A pineal não explica integralmente o fenômeno mediúnico, como simplesmente os olhos não explicam a visão. Você pode ter os olhos perfeitos, mas não ter a área cerebral que interprete aquela imagem. É como um computador: você pode ter todos os programas em ordem, mas se a tela não funciona, você não vê nada. A pineal, no que diz respeito à mediunidade, capta o campo eletromagnético, impregnado de informações, como se fosse um telefone celular. Mas tudo isso tem que ser interpretado em áreas cerebrais, como por exemplo, o córtex frontal. Um papagaio tem a pineal, mas não vai receber um espírito, porque ele não tem uma área no cérebro que lhe permita fazer um julgamento. A mediunidade está ligada a uma questão de senso-percepção. Então, a ela não basta a existência da glândula pineal, mas sim, todo o cone que vai até o córtex frontal, que é onde você faz a crítica daquilo que absorve. A mediunidade é uma função de senso (captar)-percepção (faz a crítica do que está acontecendo). Então, a mediunidade é uma função humana.
 
- A pineal converte ondas eletromagnéticas em estímulos neuroquímicos? Isso é comprovado cientificamente?
- Sim, isso é comprovado. Quem provou isso foram os cientistas Vollrath e Semm, que têm artigos publicados na revista científica Nature, de 1988.
- A parapsicologia diz que estes campos eletromagnéticos podem afetar a mente humana. O dr. Michael Persinger, da Laurentian University, no Canadá, fez experiências com um capacete que emite ondas eletromagnéticas nos lobos temporais. As pessoas submetidas a essas experiências teriam tido “visões” e sentiram presenças espirituais. O dr. Persinger atribui esses fenômenos à influência dessas ondas eletromagnéticas. O que o senhor teria a dizer sobre isso?
- Veja, o espiritual age pelo campo eletromagnético. Então, dizer que este campo interfere no cérebro não contraria a hipótese de uma influência espiritual. Porque, se há uma interferência espiritual, esta se dá justamente pelo campo eletromagnético. Quando se fala do espiritual, em Deus, a interferência acontece na natureza pelas leis da própria natureza. Se o campo magnético interfere no cérebro, a espiritualidade interfere no cérebro PELO campo magnético. Uma coisa não anula a outra. Pelo contrário, complementam-se.
- A mediunidade seria atributo biológico e não um conceito religioso? Existe uma controvérsia no meio científico a esse respeito?
- A mediunidade é um atributo biológico, acredito, que acontece pelo funcionamento da pineal, que capta o campo eletromagnético, através do qual a espiritualidade interfere. Não só no espiritismo, mas em qualquer expressão de religiosidade,  ativa-se a mediunidade, que é uma ligação com o mundo espiritual. Um hindu, um católico, um judeu ou um protestante que estiver fazendo uma prece, está ativando sua capacidade de sintonizar com um plano espiritual.  

Buda com a pinha simbólica na cabeça
 Isso é o que se chama mediunidade, que é intermediar. Então, isso não é uma bandeira religiosa, mas uma função natural, existente em todas as religiões. E isso deve acontecer através do campo magnético, sem dúvida. Se a espiritualidade interfere, é pelo campo eletromagnético, que depois é convertido, pela pineal, em estímulos eletroneuroquímicos. Não existe controvérsia entre ciência e espiritualidade, porque a ciência não nega a vida após a morte. Não nega a mediunidade. Não nega a existência do espírito. Também não há uma prova final de que tudo isto existe. Não existe oposição entre o espiritual e o científico. Você pode abordar o espiritual com metodologia científica, e o espiritismo sempre vai optar pela ciência. Essa é uma condição precípua do pensamento espírita. Os cientistas materialistas que disserem “esta é minha opinião pessoal”, estarão sendo coerentes. Mas se disserem que a opção materialista é a opinião da ciência, estarão subvertendo aquilo que é a ciência. A American Medical Association, do Ministério da Saúde dos EUA, possui vários trabalhos publicados sobre mediunidade e a glândula pineal.  O Hospital das Clínicas sempre teve tradição de pesquisas na área da espiritualidade e espiritismo. Isso não é muito divulgado pela imprensa, mas existe um grupo de psiquiatras lá defendendo teses sobre isso.
- Como são feitas as experiências em laboratório?
- Existem dois tipos: um, que é a experiência de pesquisa das estruturas do cérebro, responsáveis pela integração espírito/corpo; e outra, que é a pesquisa clínica, das pessoas em transe mediúnico. São testes de hormônios, eletroencefalogramas, tomografias, ressonância magnética, mapeamento cerebral, entre outros. A coleta de hormônios, por exemplo, pode ser feita enquanto o paciente está em estado de transe. E os resultados apresentam alterações significativas.
- As alterações em exames de tomografia, por exemplo, são exclusivas ou condizentes com outras patologias? O senhor descarta a hipótese de uma crise convulsiva?
- Isso é bem claro: a suspeita de uma interferência espiritual surge quando a alteração nos exames não justifica a dimensão ou a proporção dos sintomas. Por exemplo: o indivíduo tem uma crise convulsiva fortíssima,  é feito o eletroencefalograma e aparece uma lesão pequena. Não há, então, uma coerência entre o que está acontecendo e o que o exame está mostrando. A reação não é proporcional à causa. A mediunidade mexe com o sistema nervoso autônomo – descarga de adrenalina, aceleração do ritmo cardíaco, aumento da pressão arterial.
- Como o senhor diferencia doença mental de mediunidade?
- Na doença mental, o paciente não tem crítica da razão; no transe mediúnico, ele tem essa crítica. Quando o médium diz que incorporou tal entidade espiritual, mas que ele, médium, continua sendo determinada pessoa, ele usou a crítica, julgou racionalmente o que aconteceu. Agora, um indivíduo que diz ser Napoleão Bonaparte? Aí ele perdeu a crítica da razão. Essa é a diferença. O que não quer dizer que o indivíduo que esteja em psicose não possa estar em transe também. A mediunidade se instala no indivíduo são, ou pode dar uma dimensão muito maior a uma doença. A mediunidade sempre vai dar um efeito superlativo. Se a pessoa alimenta bons sentimentos, ela cresce. Se ela tem uma doença, a doença pode ficar fora de controle.
- É verdade que a pineal se calcifica com a meia-idade? E essa calcificação prejudica a mediunidade?
- Não, a pineal não se calcifica; ela forma cristais de apatita, e isso independe da idade. Estes cristais têm a ver com o perfil da função da glândula. Uma criança pode ter estes cristais na pineal em grande quantidade enquanto um adulto pode não ter nada. Percebemos, pelas pesquisas, que quando um adulto tem muito destes cristais na pineal, ele tem mais facilidade de seqüestrar o campo eletromagnético. Quando a pessoa tem muito desses cristais e sequestra esse campo magnético, esse campo chega num cristal e ele é repelido e rebatido pelos outros cristais, e este indivíduo então apresenta mais facilidade no fenômeno da incorporação. Ele incorpora o campo com as informações do universo mental de outrem. É possível visualizar estes cristais na tomografia. Observamos que quando o paciente tem muita facilidade de desdobramento, ele não apresenta estes cristais.
- As crianças teriam mais sensibilidade mediúnica?
- A mediunidade na criança é diferente da de um adulto. É uma mediunidade anímica, é de saída. Ela sai do corpo e entra em contato com o mundo espiritual.
- A pineal pode ser estimulada com a entoação de mantras, como pregam os místicos?
- A glândula está localizada em uma área cheia de líquido. Talvez o som desses mantras faça vibrar o líquido, provocando alguma reação na glândula. Os cristais também recebem influências de vibração. Deve vibrar o líquor, a glândula, alterando o metabolismo. Teria lógica.
- Em que se concentrarão seus próximos estudos?
- Estou preparando um estudo sobre Cronogenética da Reencarnação. Mas, sobre isso, falarei mais detalhadamente em 2003, durante o Congresso Médico-Espírita.



A GLÂNDULA PINEAL, NOVOS CONCEITOS E AVANÇOS NAS PESQUISAS  Video-Palestra já publicado em NOSSOS BONS VÍDEOS 
Dr. Sérgio Felipe de Oliveira



domingo, 18 de março de 2012

O Desnate - O mistério da Percepção desvendado

Você já deve ter percebido que todas as tradições autênticas de busca interior, entre elas o budismo, o hinduismo, o cristianismo, falam, com diferentes nuances, que o mundo é uma ilusão, uma criação da nossa mente, e por aí afora. Afirmam que a realidade não é vista diretamente por nós humanos, algo assim como um aquário onde colocaram um corante na água e o peixinho diz: “O mundo é azul”...
O cinema engajado na busca interior já percebeu isso e produziu filmes e séries muito interessantes sobre o tema, como Matrix, O Show de Truman, Cidade das Sombras e outros.
A gente então, para não encrencar logo de saída, pode até aceitar que o que chamamos de realidade, ou de mundo, é um “produto de segunda mão”, uma interpretação da “verdadeira realidade”.  Mas esse aceitar soa mais como uma adesão gratúita, um "aceitar por aceitar", porque a rigor aí tem um problema, um ponto obscuro: como funciona esse processo pelo qual a realidade é escamoteada de nós? Como é exatamente que a gente é enganado? Ninguém explica isso direito.
Vamos então tentar explicar segundo a visão dos videntes toltecas que há muitos milhares de anos atrás esclareceram o mistério melhor que a Psicologia atual, que somente agora começou a arranhar a superfície da coisa.
Antes disso, como já acenamos de passagem em algumas postagens anteriores como O Mar Escuro da Consciência, temos que dar uma breve visão geral de alguns conceitos que formam o universo dessa incrí vel e milenar tradição. Vamos ver o que diziam os toltecas:
•    Há duas forças universais, de criação e destruição, atuando a cada instante eternamente. Uma faz, outra desfaz.
 
•    Então, a função de qualquer ser vivo é gerar Consciência para alimentar essa fonte eterna de energia inteligente chamada de O Mar Escuro da Consciência, senão ela acaba. 
•    Visto pelos xamãs e videntes toltecas, em estados alterados de consciência, O Mar Escuro da Consciência se mostra como uma incomensurável Águia.
•    Essa fonte produz emanações (chamadas “comandos da Águia”) que sustentam a vida de tudo o que há no Universo, mas na hora da morte Ela pede de volta a Consciência que foi produzida pelos seres vivos, na sua passagem pelos mundos. Ela dá Vida e cobra a Consciência obtida. Justo, não? Você pensou que viver era de graça?...
•    As emanações (Gurdjieff as chama de impressões - "sem as quais não vivemos sequer um segundo") que chegam aos seres vivos são caóticas, pois vem de uma dimensão profunda, fora do tempo e espaço do cosmos, fora da mente racional, e quem as vislumbrasse diretamente não entenderia nada ou poderia ficar louquinho. As ervas usadas pelos xamãs em rituais tem o poder, entre outras coisas, de dar ao iniciante uma visão desse intrigante caos, como forma de quebrar a ditadura da mente racional que insiste em que o mundo é só esse mundo visto pelos 5 sentidos. Foi assim que Don Juan fez com Castaneda, que tomou peyote e mescalito, mas somente para "quebrar" seu mental teimoso e cristalizado. Não era para dar nenhum "barato".
•    A Águia nos deu a Razão, uma ferramenta para organizar o caos e torná-lo compreensível nessa dimensão em que estamos, mas a Razão não entende o caos. Ela precisa de um filtro que traduza e interprete as emanações “em estado bruto”, tornando-as familiares a nós.
•    Às emanações filtradas e interpretadas, nós chamamos de mundo, coisas, objetos, pensamentos, sensações, emoções, sentimentos, realidade, universo, ou lá o que seja.
•    O processo de filtrar a realidade era chamado pelos toltecas de “desnate”, pois é exatamente como fazemos com o leite fervido para tirar a nata e deixá-lo bonitinho e estéticamente aceitável e agradável. É assim que nos ensinam a fazer com a impressões que nos chegam, transformando-as no mundo familiar que conhecemos.
•    Uma vez que uma impressão qualquer foi “desnatada” quando chegou, nunca mais vamos percebê-la originalmente como era. Só como ficou de aí por diante.
•    A Percepção acontece fora do nosso corpo físico, mas ainda dentro do invólucro maior que é o nosso corpo energético. Ela ocorre dentro de uma esfera luminosa do tamanho de uma bola de tênis que fica nas costas do ovo luminoso que envolve nosso corpo, na altura da omoplata. Esse ovo é o nosso corpo energético.
 
•    Existem 3 atenções, 3 níveis de talento, cada uma com seu domínio independente, completas por si só. Esse processo do desnate se dá na primeira atenção, que é a habitual do dia a dia, a única que conhecemos. A segunda é a atenção intensificada dos xamãs, homens de conhecimento, e que às vezes pressentimos, mas logo descartamos. A terceira, raríssima, é a atenção unificada pelo fogo interior, que acende todas as emanações da Águia presentes no ovo luminoso do ser, e o transforma em energia sem deixar vestígios. (As tradições registram casos conhecidos do fenômeno)

Muito bem. Definidos os conceitos, vamos à operação. (Está parecendo apresentação de negócios. - rsrs)
Cena: Somos ainda bebes. Chega à nossa percepção uma emanação qualquer vinda das profundezas da Consciência (impressão de qualquer tipo nos cinco sentidos conhecidos - mais outros sentidos que sequer conhecemos). Nós nos maravilhamos. Ato contínuo, chega alguém, o pai, a mãe, professor, padre, rabino, pastor, sei-lá-quem (o mundo está cheio de ajudantes e mestres generosos e dedicados) e prontamente, com a maior das boas intenções, define a complexa emanação de uma maneira rasteira como ele ou ela mesmo aprendeu pelo processo de socialização da chamada "educação": em geral ele ou ela dá um nome à coisa, ou esconde “porque é feio”, ou descarta, ou “enfeita o pavão”. Pronto. Rotulou. Desnatou. Fechou o assunto. Na próxima vez que a emanação se apresentar, a vítima já está vendo a impressão “desnatada”. Não é mais a mesma emanação original, mas um subproduto falsificado da Realidade. A vítima então já é um sócio, já pertence ao clube, que é toda a humanidade socializada, que enxerga tudo padronizado como vimos em Matrix e nos outros 2 filmes. Você é um deles. Tristeza, não? Mas tem que ser assim... O personagem do filme, Neo (novo ser) é cada um de nós, com a vocação de sair dessa.

 O que é então esse desnate? É o filtro da Realidade. É o que a transforma numa interpretação falseada dela mesma.
É esse processo que chamamos ingenuamente de Aprendizado, Educação... Para nos reconectarmos mais tarde com a Realidade, temos que desaprender tudo com muito esforço e dedicação. Bota esforço nisso.
Vamos abaixo relatar uma manobra soberba de dois exímios xamãs, Don Juan e Don Genaro, manipulando a percepção do aprendiz Castaneda, para mostrar o que era uma impressão antes do “desnate”, ou seja, como era o mundo das emanações, dos comandos da Águia antes de a filtragem do aprendizado “interpretar” a Realidade: como é que era primordialmente, por exemplo, a complexa emanação original chamada por nós (depois de interpretada) de o sol, a árvore, o chão, etc, e cuja percepção, antes do desnate, demandava todo o nosso ser integralmente, todos os sentidos conhecidos ou não, e não somente um deles como fazemos habitualmente. 

Até aqui, tudo bem? Todos a bordo? Então vamos nessa:

"- Dom Juan aproximou-se mais de mim. Inclinou-se e cochichou em meu ouvido direito.
Dom Genaro também se inclinou para mim e cochichou em meu ouvido esquerdo.

Ficaram sussurrando em meus ouvidos até eu ter a sensação de estar sendo dividido ao meio. Tornei-me uma névoa, como na véspera, um brilho amarelo que sentia tudo diretamente. Isto é, eu podia saber as coisas. Não se tratava de pensamentos; só havia certezas. E quando entrei em contato com uma sensação suave, esponjosa, saltitante, que ficava fora de mim e no entanto era parte de mim, eu sabia que era uma árvore. Senti que era uma árvore pelo cheiro. Não tinha o cheiro de nenhuma árvore específica de que eu me lembrasse, e não obstante alguma coisa dentro de mim sabia que aquele odor especial era a essência da árvore. Não tinha apenas a impressão de saber, nem raciocinei sobre meu conhecimento, nem remexi com indícios. Simplesmente sabia que havia ali alguma coisa em contato comigo, em volta de mim, um cheiro amigo, quente e compulsivo emanando de algo que não era nem sólido nem líquido, e sim algo diferente, indefinido, que eu sabia ser uma árvore. Senti que sabendo dela desse jeito eu estava tocando em sua essência. Não me sentia repelido por ela. Ao contrário, ela me convidava para me fundir com ela. Engolfava-me, ou eu a engolfava. Havia um laço entre nós que não era nem maravilhoso nem desagradável.
A sensação seguinte de que pude me lembrar com clareza foi uma onda de assombro e exultação. Em mim, tudo vibrava. Era como se me atravessassem cargas de eletricidade. Não eram dolorosas. Eram agradáveis, mas de uma forma tão indeterminada que não havia meio de classificá-las. Não obstante, eu sabia que aquilo com que eu estava em contato era o solo. Uma parte de mim reconhecia com uma certeza precisa que era o solo. Mas no momento em que tentei distinguir a infinidade de percepções diretas que eu estava tendo, perdi toda a capacidade de diferenciar minhas percepções.
Aí, de repente, eu era eu mesmo outra vez. Estava pensando. Foi uma transição tão abrupta que pensei que eu tinha acordado. No entanto, havia algo em meu modo de sentir que não era bem eu. Eu sabia que realmente faltava alguma coisa antes mesmo de abrir bem os olhos. Olhei em volta. Ainda estava num sonho, ou tendo alguma visão. Meus processos mentais, porém, não só estavam afetados, como eram extraordinariamente claros. Fiz uma avaliação rápida. Eu não tinha dúvidas de que Dom Juan e Dom Genaro tinham provocado meu estado de sonho com um  propósito específico em mente. Eu parecia estar a ponto de compreender qual era esse propósito quando algo estranho a mim obrigou-me a prestar atenção ao que me cercava. Levei tempo para me orientar. Eu estava deitado de bruços, e num chão espetacular. Examinando-o, não pude deixar de sentir assombro e admiração. Não consegui imaginar de que fosse feito. Placas irregulares de alguma substância desconhecida tinham sido colocadas de um modo muito complexo e ao mesmo tempo simples. Tinham sido postas juntas, mas não estavam pregadas no chão nem umas nas outras. Eram elásticas e cediam quando eu tentava afastá-las com meus dedos, mas quando as soltava, voltavam logo a sua posição original.
Tentei levantar-me e fui preso da mais absurda distorção sensorial. Eu não tinha controle sobre meu corpo; na verdade, meu corpo nem parecia me pertencer. Era inerte; eu não tinha ligação com nenhuma de suas partes e, quando tentei levantar-me, não consegui mexer os braços e fiquei me contorcendo indefeso, de barriga para baixo, rolando de lado. O impulso de minhas contorções quase me fez dar uma volta completa, tornando a ficar de bruços. Meus braços e pernas esticados me impediam de virar-me e fui parar de costas. Nessa posição, vi de relance duas pernas de forma estranha e os pés mais distorcidos que jamais vira. Era o meu corpo!
Eu parecia estar envolto numa túnica. A idéia que me veio à mente foi que eu estava experimentando uma cena de mim mesmo como aleijado ou inválido. Tentei curvar as costas e olhar para minhas pernas, mas só conseguia sacudir o corpo. Estava olhando para um céu amarelo, um céu de um amarelo-limão, forte e profundo. Ele tinha fendas ou canais de um tom amarelo mais profundo e uma porção de protuberâncias penduradas como pingos d’água. O efeito total daquele céu incrível era arrasador. Eu não conseguia saber se as protuberâncias eram nuvens. Havia ainda zonas de sombras e zonas de diferentes tons de amarelo, que fui descobrindo ao mexer a cabeça de um lado para o outro.
Aí alguma outra coisa atraiu a minha atenção: um sol no zênite mesmo do céu amarelo, bem sobre minha cabeça, um sol fraco a julgar pelo fato de eu poder olhar para dentro dele - que lançava uma luz calmante, branca e uniforme.
Antes de ter tempo de ponderar sobre todas essas visões extraterrenas, fui violentamente sacudido; minha cabeça pulava para diante e para trás. Senti que estava sendo erguido. Ouvi uma voz estridente e risadas e defrontei-me com um espetáculo realmente espantoso: uma mulher gigantesca, descalça. A cara dela era redonda e enorme. Seus cabelos negros estavam cortados no estilo pajem. Tinha braços e pernas gigantescos. Pegou-me e levantou-me, pondo-me em seus ombros, como se eu fosse um boneco. Meu corpo estava flácido. Olhei pelas costas dela. Tinha uma penugem fina em volta dos ombros e pela espinha abaixo. Olhando para baixo, dos ombros dela, tornei a ver aquele chão maravilhoso. Eu o ouvia ceder, elástico, sob o peso imenso dela e via as marcas de pressão que seus pés deixavam nele.
Ela me largou de bruços defronte de uma estrutura, uma espécie de prédio. Aí notei que havia algo de errado com a minha percepção de profundidade. Não consegui avaliar o tamanho do prédio, olhando para ele. Em certos momentos, parecia ridiculamente pequeno, mas depois que eu, aparentemente, ajustei minha percepção, fiquei realmente maravilhado com suas proporções monumentais.
A moça gigantesca sentou-se a meu lado e fez o chão ranger. Eu estava encostado a seu joelho imenso. Ela tinha cheiro de bala ou morangos. Falou comigo e eu entendi tudo o que ela disse; apontando para a estrutura, ela me afirmou que eu ia morar ali.
Meus poderes de observação pareceram aumentar, quando venci o choque inicial de me encontrar naquele local. Reparei então que o prédio tinha quatro lindas colunas não funcionais. Nada sustentavam; estavam em cima do prédio. Sua forma era a simplicidade total; eram projeções longas e graciosas, que pareciam se estar estendendo até aquele céu assombroso, incrivelmente amarelo. O efeito daquelas colunas invertidas era de pura beleza para mim. Tive um acesso de êxtase estético.
As colunas pareciam ter sido feitas de um só bloco; eu não podia nem conceber como. As duas colunas da frente estavam ligadas por uma trave fina, uma barra de comprimento monumental, que, pensei, podia ter servido como parapeito ou de varanda.
A moça gigantesca me fez deslizar de costas para dentro da estrutura. O telhado era negro e plano, coberto de furos simétricos, que deixavam passar o brilho amarelado do céu, criando os desenhos mais complicados. Fiquei realmente assombrado com a completa simplicidade e beleza alcançadas por aqueles pingos de céu amarelo aparecendo por aqueles furos precisos no telhado e os desenhos de sombras que eles criavam naquele chão magnífico e complicado. A estrutura era quadrada e, fora de sua beleza tocante, ela me era incompreensível.
Meu estado de exaltação era tão intenso naquele momento que tive vontade de chorar, ou de ficar ali para sempre. Mas alguma força, ou tensão, ou algo de indefinível começou a me puxar. De repente, vi que estava do lado de fora da estrutura, ainda deitado de costas. A moça gigantesca se encontrava lá, mas com ela havia outra criatura, uma mulher tão grande que chegava até o céu e tapava o sol. Comparada com ela, a moça gigantesca não era mais que uma menininha. A mulher grande estava zangada; agarrou a estrutura por uma de suas colunas, levantou-a, virou-a de pernas para o ar e largou-a no chão. Era uma cadeira!
Aquela percepção foi catalisadora; desencadeou percepções arrasadoras. Passei por uma série de imagens desconexas, mas que podiam figurar como uma seqüência. Em lampejos sucessivos, vi ou percebi que o piso magnífico e incompreensível era uma esteira de palha; o céu amarelo era o teto de estuque de um quarto: o sol, uma lâmpada; a estrutura que provocara tal êxtase em mim era uma cadeira que uma criança virara de pernas para o ar para brincar.
Tive mais uma visão coerente e em seqüência de outra estrutura arquitetônica misteriosa de proporções monumentais. Ela estava isolada. Parecia quase a concha de uma lesma pontuda com a cauda levantada. As paredes eram feitas de placas côncavas e convexas de um material estranho e roxo; cada placa apresentava fendas que pareciam mais funcionais que ornamentais.
Examinei a estrutura meticulosamente em seus detalhes e descobri que, como no caso anterior, ela era completamente incompreensível. Esperava de repente ajustar minha percepção para revelar a verdadeira natureza da estrutura. Mas nada aconteceu a esse respeito. Tive então um aglomerado de consciências ou descobertas alheias e emaranhadas quanto ao prédio e sua função, que não faziam sentido, pois eu não tinha um padrão de referência para elas.
Recuperei minha consciência normal de repente. Dom Juan e Dom Genaro estavam a meu lado. Eu me senti cansado. Procurei meu relógio; tinha sumido. Dom Juan e Dom Genaro riram-se em coro. Dom Juan disse que eu não devia estar preocupando-me com a hora e sim concentrar-me em seguir certas recomendações que Dom Genaro me fizera.
Virei-me para Dom Genaro e ele disse uma piada - a recomendação mais importante era que eu aprendesse a escrever com o dedo, para economizar os lápis e para me exibir.
Eles ainda implicaram mais um pouco comigo por causa de minhas anotações e depois eu fui dormir.
Dom Juan e Dom Genaro escutaram o relato detalhado de minha experiência, que lhes dei a pedido de Dom Juan, depois que acordei no dia seguinte.
- Genaro acha que você já fez bastante, por enquanto – disse Dom Juan, quando terminei.
Dom Genaro concordou, com um meneio.
- Qual o significado do que experimentei ontem à noite? Perguntei.
- Você teve uma visão da coisa mais importante da feitiçaria - explicou Dom Juan. - Ontem à noite você espiou a totalidade de você. Mas naturalmente isso é uma coisa sem sentido para você, neste momento. Obviamente, chegar à totalidade de seu ser não depende de seu desejo de concordar, nem da disposição de aprender. Genaro acha que seu corpo precisa de tempo para deixar que os sussurros do nagual penetrem você.
Dom Genaro tornou a balançar a cabeça.
- Muito tempo - disse ele, sacudindo a cabeça para cima e para baixo. - Uns 20 ou 30 anos, talvez.
Não sabia como reagir. Olhei para Dom Juan, buscando indicações. Os dois estavam sérios.
- Preciso mesmo de 20 ou 30 anos? - perguntei.
- Claro que não! - gritou Dom Genaro, e os dois caíram na gargalhada.
Dom Juan disse que eu devia voltar sempre que minha voz interior me mandasse, e que enquanto isso devia procurar concatenar, todas as sugestões que eles tinham feito enquanto eu estava dividido.
- E como vou fazer isso? - perguntei.
- Desligando seu diálogo interno e deixando alguma coisa em você fluir e expandir-se - disse Dom Juan. - Essa coisa é a sua percepção, mas não procure decifrar o que quero dizer. Apenas deixe que os sussurros do nagual o guiem.
Aí ele disse que na noite anterior eu tivera duas séries de visões intrinsecamente diferentes. Uma era inexplicável, a outra, perfeitamente natural, e a ordem em que tinham ocorrido mostrava uma condição que é intrínseca a todos nós.
- Uma foi o nagual, a outra, o tonal - acrescentou Dom Genaro.
Pedi que ele explicasse essa declaração. Ele me olhou e me deu um tapinha nas costas.
Dom Juan interveio e disse que as duas primeiras visões eram o nagual e que Dom Genaro escolhera uma árvore e o solo como os pontos de ênfase. As duas outras eram visões do tonal, que ele próprio escolhera; uma delas era minha percepção do mundo como criança.
- Parecia-lhe ser um mundo estranho porque a sua percepção ainda não fora preparada para caber no molde desejado - disse ele.
- Foi mesmo assim que vi o mundo? - perguntei.
- Por certo - disse ele. - Isso foi a sua memória.
Perguntei a Dom Juan se a sensação de apreciação estética que me extasiara também fazia parte de minha memória.
- Nós temos essas visões como estamos hoje - disse ele.
Você estava vendo aquela cena como a veria agora. No entanto, o exercício era de percepção. Era uma cena de uma época em que o mundo se tornou para você o que é agora. Um tempo em que uma cadeira tornou-se uma cadeira”.


Eu acrescentaria: "cena de uma época em que para você, as coisas ainda não tinham nome, só essência. Apenas eram. E você via a essência delas na sua totalidade. Sem desnate".

domingo, 11 de março de 2012

O Mar Escuro da Consciência, Mundos Gêmeos, Seres Inorgânicos, a Morte, "y otras cositas más"


Se me perguntassem “qual o melhor livro que você leu na sua vida?” eu diria sem dúvida “16 livros da obra de Castaneda e discípulos” (rsrs).
Exagero? O editor do New York Times, um "jornalzinho lá da matriz", sério, e parcimonioso em distribuir elogios, disse em 2001, quando foi editado o 12º livro do autor, O Lado Ativo do Infinito: “Somos incrivelmente afortunados em ter os livros de Carlos Castaneda.Tomados em conjunto formam uma obra que está entre o melhor que a ciência da Antropologia já produziu.
Por essa você não esperava, né?...Eu acrescentaria: "e o melhor que a tradição do Xamanismo produziu, também".
Infelizmente há um porém: grande parte da compreensão da obra foi comprometida pelo trabalho de “tradutores-traidores” que juntaram o seu desconhecimento do tema à “marquetagem” oportunista das editoras. Quer um exemplo?: O 1º livro da obra, que em inglês chama-se “The Teachings of Don Juan” ou Os Ensinamentos de Don Juan, foi traduzido e publicado no Brasil como “A Erva do Diabo”, para linkar a obra às drogas e a cultura hippie dos anos 60, que dava mais dinheiro que chuchu na serra. Isso deu resultado comercial  imediato, mas comprometeu a divulgação da valiosa tradição dos videntes toltecas de conhecimento interior. Muita gente torce o nariz até hoje, achando que a obra é uma apologia das drogas e ervas alucinógenas, apesar das explicações claras de Don Juan. Mas isso é outra história...
Vamos ver então Don Juan falando a Castaneda dessa energia descomunal, incompreensível e eterna que os homens de conhecimento toltecas chamava o Mar Escuro da Consciência (outros chamam de Deus), e falando também de mundos gêmeos, seres inorgânicos, morte “y otras cositas”: 

Os xamãs videntes toltecas "viam" essa energia como A Águia, uma incomensurável fonte de energia eterna, que estava ligada a cada esfera individual de Consciência humana ou de qualquer ser senciente no Universo , pois ela empresta Vida a todos os seres e no final da vida pede a consciência adquirida de volta. Muito aqui entre nós, os videntes, através de um processo chamado Recapitulação, faziam uma cópia da Consciência que adquiriram na vida, entregavam-na à Águia na hora da morte e mantinham a sua consciência individual depois da morte. E diziam que qualquer um poderia fazer isso (com muito trabalho, claro. Quer moleza?). Ops, contei o final do filme...
Vamos lá:
“- Enquanto estavam no auge de seus poderes de percepção, os videntes toltecas viam algo que os fazia tremer nas calças, se estivessem vestindo uma. Viam que o Mar Escuro da Consciência é responsável não só pela consciência dos organismos, mas também pela consciência das entidades que não têm um organismo.
- O que é isso, Dom Juan, seres sem um organismo, e que têm consciência? - perguntei, surpreso, pois ele nunca mencionara essa idéia antes.
- Os xamãs antigos descobriram que todo o universo é composto de forças gêmeas - ele começou -, forças que são ao mesmo tempo opostas e complementares entre si. É inevitável que o nosso mundo seja um mundo gêmeo. Seu mundo oposto e complementar é habitado por seres que têm consciência, mas não um organismo. Por essa razão, os xamãs antigos os chamam de seres inorgânicos.
- E onde está esse mundo, Dom Juan?
- Aqui, onde você e eu estamos sentados - respondeu com naturalidade, mas rindo abertamente de meu nervosismo. - Eu disse a você que esse era o nosso mundo gêmeo, portanto está intimamente relacionado a nós. Os feiticeiros do México antigo não pensavam como você pensa em termos de espaço e tempo. Pensavam exclusivamente em termos de consciência. Dois tipos de consciência coexistem sem nunca colidir uma com a outra, pois cada tipo é completamente diferente do outro. Os xamãs antigos enfrentavam esse problema de coexistência sem se preocuparem com tempo e espaço. Raciocinavam que o grau de consciência dos seres orgânicos e o grau de consciência dos seres inorgânicos eram tão diferentes que ambos poderiam coexistir com o mínimo possível de interferência.
- Nós podemos perceber esses seres inorgânicos, Dom Juan? - perguntei.
- Com certeza - respondeu ele. - Os feiticeiros os percebem quando querem. As pessoas comuns fazem isso, mas não se dão conta que o fazem porque não são conscientes da existência do mundo gêmeo. Quando pensam em um mundo gêmeo, entram em todo tipo de masturbação mental, mas nunca lhes ocorre que as suas fantasias têm sua origem num conhecimento subliminar que todos nós temos: que não estamos sós.
Fiquei preso às palavras de Dom Juan.
- A dificuldade de se perceber as coisas em termos de tempo e espaço - continuou ele - é que você só nota se alguma coisa desembarcou no tempo e no espaço que está à sua disposição, e isso é muito limitado. Os feiticeiros, por outro lado, possuem um vasto campo onde podem notar se algo estranho desembarcou. Muitas entidades do universo como um todo, entidades que possuem consciência mas não um organismo, desembarcam no campo de consciência de nosso mundo, ou no campo de consciência de seu mundo gêmeo, sem que um ser humano comum jamais os perceba. As entidades que desembarcam em nosso campo de consciência, ou no campo de consciência de nosso mundo gêmeo, pertencem a outros mundos que existem além do nosso mundo e de seu gêmeo. O universo como um todo está abarrotado até a borda de mundos de consciência, orgânicos e inorgânicos.”
Curiosamente, aqui entre nós (mais a Dona Dolores e os meninos da escola) a “ciência de plantão” fala hoje nos Discovery, NatGeo e outros, de mundos gêmeos não mais como “coisa pseudo-científica inventada” mas como “coisa da vanguarda do conhecimento”. Os índios toltecas falavam do assunto já há milhares de anos em volta da fogueira. É mole?  A história do verdadeiro conhecimento da humanidade precisa ser reescrita.
“Dom Juan continuou falando e disse que aqueles feiticeiros sabiam quando a consciência inorgânica dos outros mundos além de nosso mundo gêmeo tinha desembarcado nos seus campos de consciência. Disse que, como todos os seres humanos nessa terra fariam, aqueles xamãs faziam intermináveis classificações dos diferentes tipos dessa energia que possui consciência. Elas eram conhecidas pelo termo genérico de seres inorgânicos.
- Esses seres inorgânicos têm vida como a nossa vida? perguntei.
- Se você pensa que Vida é ter Consciência, então eles têm vida - disse ele. - Suponho que seria correto dizer que se a vida pode ser medida pela intensidade, pela agudeza, pela duração daquela consciência, posso sinceramente dizer que eles são mais vivos do que você e eu.
- Esses seres inorgânicos morrem, Dom Juan? - perguntei. Dom Juan deu um risinho antes de responder.
- Se você chama morte o término da consciência, sim, eles morrem. Sua consciência acaba. Sua morte é como a morte de um ser humano e, ao mesmo tempo, não é, porque a morte dos seres humanos tem uma opção oculta. É algo como uma cláusula num documento legal, uma cláusula que é escrita em letras muito pequenas que mal se consegue enxergar. Você precisa usar uma lente de aumento para ler, porém é a cláusula mais importante do documento.
- Qual é a opção oculta, Dom Juan?
- A opção oculta para a morte é exclusiva dos feiticeiros. Eles são os únicos, que eu saiba, que leram as letrinhas. Para eles, a opção é pertinente e funcional. Para os seres humanos comuns, morte significa o fim de sua consciência, o fim de seu organismo. Para os seres inorgânicos, morte significa o mesmo: o fim de sua consciência. Em ambos os casos, o impacto da morte é o ato de ser sugado para o Mar Escuro da Consciência. As suas consciências individuais, carregadas com as suas experiências de vida, quebram as suas fronteiras, e a consciência enquanto energia se perde no Mar Escuro da Consciência.
- Mas o que é a opção oculta da morte que somente os feiticeiros captam, Dom Juan? - perguntei.
- Para um feiticeiro, a morte é um fator unificador. Em vez de desintegrar o organismo, como comumente acontece, a morte o unifica.
- Como pode a morte unificar alguma coisa? - protestei.
- A morte para um feiticeiro - disse ele - termina o reino dos temperamentos individuais no corpo. Os feiticeiros antigos acreditavam que era o domínio de diferentes partes do corpo que regia os temperamentos e as ações do corpo total; partes que se tornaram disfuncionais arrastavam o resto do corpo para o caos, como, por exemplo, quando você fica doente por comer porcaria. Nesse caso, o estado do seu estômago afeta todo o resto. A morte erradica o domínio dessas partes individuais. Ela unifica a sua consciência em uma única unidade.
- Você quer dizer que depois que os feiticeiros morrem ainda são conscientes? - perguntei.
- Para os feiticeiros, a morte é um ato de unificação que emprega cada parte da energia deles. Você está pensando na morte como um cadáver à sua frente, um corpo que começa a se decompor. Para os feiticeiros, quando o ato de unificação ocorre, não há cadáver. Não há decomposição. Seus corpos, na sua totalidade, se transformaram em energia, e a energia que possui consciência não é fragmentada. Os limites que são causados pelo organismo são interrompidos pela morte e ainda estão funcionando no caso dos feiticeiros, apesar de não serem mais visíveis a olho nu.
"Sei que você está morrendo de vontade de me perguntar - continuou ele com um amplo sorriso - se o que eu estou descrevendo é a alma que vai para o céu ou para o inferno. Não, não é a alma. O que acontece com os feiticeiros, quando eles escolhem essa opção oculta da morte, é que eles se tornam seres inorgânicos, muito especializados, seres inorgânicos de alta velocidade, seres capazes de manobras estupendas de percepção. Os feiticeiros entram então no que os xamãs do México antigo chamavam de sua viagem definitiva. O infinito se torna o seu reino de ação."
- Você quer dizer com isso, Dom Juan, que eles se tornam eternos?
- Minha sobriedade como um feiticeiro me diz - disse ele - que a consciência deles terminará da maneira como a consciência dos seres inorgânicos termina, mas eu não vi isso acontecer. Não tenho um conhecimento de primeira mão sobre isso. Os feiticeiros antigos acreditavam que a consciência desse tipo de ser inorgânico duraria o tempo que a Terra estiver viva. A Terra é a matriz deles. Enquanto ela prevalecer, sua consciência continua. Para mim, essa é uma afirmação bem razoável.
A continuidade e a ordem da explicação de Dom Juan tinham sido, para mim, magníficas. Eu não tinha mais nada a contribuir. Ele me deixou com uma sensação de mistério e expectativas não expressas a serem preenchidas.”

É interessante o paralelo entre e a visão tolteca e a visão de Gurdjieff sobre a imortalidade, colhida em suas andanças misteriosas pela Europa oriental e Ásia. Ele dizia naquele seu estilo obscuro, que  "o ser humano poderia atingir a  imortalidade, mas dentro dos
limites do sistema solar".

domingo, 4 de março de 2012

O Outro

Eu tinha uma amiga que dizia: “eu gosto do povo, adoro. Só não gosto do cheiro do povo no ônibus”. Pois é, o outro é assim, um desafio, sempre. Mesmo quando “gostamos” dele.
Não é à toa que na divisão das 12 casas astrológicas que perfazem a nossa vida, a Casa 1, que é “o meu eu”, é oposta à Casa 7, “o outro”, do outro lado, a 180º de distância, nos encarando... Não tem escapatória. Esse outro é tanto o inimigo declarado, o parceiro (a) de vida, o sócio, o concorrente. Para o médico é o paciente, para o vendedor é o comprador, e por aí afora... E a nossa vida está entrelaçada com a do outro como essas crianças na imagem aí em cima.

Eu pergunto, aqui entre nós: - “você não acha sintomático que o cônjuge e o inimigo declarado sejam personagens  da mesma casa 7?” Abra o olho cumpadre (e cumadre). Aí tem coisa. E não contaram para nós. Vamos ter que descobrir sozinhos...
 E por falar em sozinho, é curioso: a gente nasce sozinho e vai morrer sozinho, prestando conta para si mesmo e mais ninguém, mas no entremeio vai conviver, bem ou mal, todo o tempo com o outro. E a gente ama e odeia isso. Às vezes ao mesmo tempo. É estranho... Por que é assim? Não sei. Não sabemos. Precisamos ser sinceros quanto à nossa incompetência.
Eu tenho um pressentimento, sei lá se é verdadeiro ou falso, mas vou dizer (se não funcionar, a gente continua na busca). Como já falamos na postagem
Meditar? Orar? Para que? vamos então nos atrever a propor uma “teoria da geração de tudo”, uma Cosmogenia que, entre outras, explica essa coisa da existência do outro: parafraseando Don Juan e o hinduismo, existe no Universo uma força de Criação da Consciência (Brahma) e outra de Destruição (Shiva) atuando a todo instante sem parar. Vishnu, o terceiro fica só na Manutenção, equilibrando os estragos dos dois (rsrs). Então, se a Criação e a Destruição são simultâneas, o Universo precisa de Consciência sendo gerada a todo o instante, on line, em tempo real, como diz a garotada antenada. E portanto precisa de Ex-pe-ri-ên-cia. Precisa de nós, seres vivos, desde o mais simples vírus até os humanos. Todos ganhamos Vida e devolvemos Consciência, como diziam os homens de conhecimento toltecas. Daí a expressão “crescei e multiplicai-vos” dita por outro homem de conhecimento que sabia das coisas, expressão que aliás no nosso planeta está meio em baixa por causa da superpopulação.
Por isso estamos aqui: nos demos a nós mesmos um equipamento físico, emocional, mental e espiritual tingido por umas coisas como apego, raiva, ignorância e no final, a cereja do bolo: o outro. Nós mesmos nos demos o outro, não podia ser diferente. Igual e oposto a nós, ao mesmo tempo. E a paisagem que nos demos em volta qual é?: Recursos inflexíveis, sabiamente dosados, e apetites insaciáveis, É mole?
Esse embate com o outro é o grande gerador de experiências e portanto de Consciência de que o Universo precisa: atrito. É o atrito entre opostos como possibilidade criativa de experiências.
Se você discorda, pode fazer uma experiência decisiva: imagine-se (não vai ser fácil) vivendo num mundo sem o outro, sem o seu semelhante, ou melhor, o seu diferente. Mas imagine mesmo, senão não dá para aceitar ou refutar a teoria. Nesse tal mundo, se não há o outro, não há como haver nenhuma das 7 virtudes (temperança, caridade, simplicidade, paciência, generosidade, diligência, humildade) ou os 7 pecados capitais (orgulho, preguiça, inveja, luxúria, raiva, gula, avareza). Essas coisas só aparecem a dois ou mais: sem o outro, vai ser uma paradeira federal. Bota tristeza nisso. Não há Consciência que brote aí. Sem o outro a aridez é total. Já pensou num mundo sem Luxúria? Vixe! (rsrs)
Então você, muito gentil, diz: ‘ok, vou aceitar em princípio a sua teoria “sub judice”, ou seja, até prova em contrário. Mas tenho uma pergunta: “como eu faço para me relacionar com o outro de uma forma justa, equânime, tanto exterior como interiormente?”
Essa sim é A pergunta.
A resposta eu na sei, mas estamos trabalhando nisso. Todo o tempo. A pergunta é sempre mais interessante que a resposta, porque deixa o tema sempre no modo aberto. Começo a achar que talvez a resposta não seja a resposta em si, mas sim o trabalhar nisso, sem descanso. Vamos lá:
O “se relacionar com o outro” exige uma pá de coisas:
A primeira coisa, e principal, é você “estar presente” (rsrs). Você deve ter pensado: esse cara é doido. Como posso me relacionar com o outro se não estou presente? Por telepatia? Mas é de outra presença que estamos falando, é claro. É a presença interior, no instante, no Agora,  de que as tradições sem exceção falam. Eckhart Tolle tem textos e vídeos encantadores sobre isso. Presença é “ocupar” todo o seu corpo físico, estar sentindo-o sem pensar nele, atento e aberto para o outro. Na cena só existe a sua Atenção e o outro . A rigor mesmo só existe a sua Atenção. É claro que quando a gente faz a lição de casa direitinho, a gente está presente “de carona” também no emocional e mental e sentindo  no conjunto dos três, cada vibração e impressão que chega, ao mesmo tempo em que está se relacionando com o outro. Parece difícil no início, principalmente nos picos emocionais, absorventes, na hora do racha, mas aos poucos a gente acerta. É um largar atento, um deixar fluir. Se a gente se perder, volta e retoma...
A outra coisa é agir exteriormente com o outro com a maior consideração possível (seja ele quem for, seja na situação que for), exatamente como agimos com uma pessoa querida, que queremos agradar. Difícil? Bota difícil nisso. Não podemos esquecer que estamos lidando com dois egos insuportáveis, o nosso e o dele. Para funcionar, o agente da nossa ação deve estar previamente ciente de que o ponto não é “ganhar a discussão” mas, sem perder o objetivo, estar presente contemplando-se na ação, identificando as energias e observando, tão imparcialmente quanto possível, a resistência ridícula e mesquinha do ego. Aliás dos dois egos. Isso não significa “ser bonzinho” mas um segredo é não “bater de frente”. Gurdjieff chamava esse processo de “consideração exterior”, ou seja, independentemente de o seu ego achar que o outro ego seja um (a) pulha, você o trata exteriormente com consideração. Não confunda isso com essa coisa viscosa chamada de “politicamente correto”. São coisas parecidas só por fora, mas a nossa nos põe diante de uma dificuldade quase insuperável, a de conscientemente tratar alguém  exteriormente com consideração, quando o seu próprio ego está revoltado interiormente, querendo pular no pescoço do outro e esganá-lo. Lembrei-me de um rabino que disse; "É muito melhor interiormente para nós, ser gentil do que ter razão".
Uma terceira coisa é uma constatação absolutamente insuportável para o nosso ego que vive na dualidade “eu e o outro”. O grande filósofo popular, Vicente Mateus, ex-presidente do Corinthians dizia, reafirmando essa dualidade: “uma coisa é uma coisa, outra coisa é outra coisa”. (rsrs).
Pois bem, o que eu vou dizer é uma coisa tão insuportável para o nosso ego, que eu vou falar rapidinho e sair de fininho, como criança que “fez reinação”. A constatação é a seguinte: 

 O outro é a sua sombra.
O outro é tudo o que é sombrio demais para você aceitar como seu. Aqui entre nós, apesar de o seu ego espernear – chegue um pouco mais que eu vou contar um segredo no pé do seu ouvido (essa vai ser "braba"):
“O outro é você”.
E durma com um barulho desses.
Domingo que vem, tem mais.