Nascido em 1975, em Nubri, Nepal, Yongey Mingyur Rinpoche é uma estrela em ascenção da nova geração de mestres do budismo tibetano treinados fora do Tibet.
Aos 3 anos, foi formalmente reconhecido pelo 6º Karmapa como a sétima encarnação de Yongey Mingyur Rinpoche, um estudioso e adepto da meditação do século XVII conhecido como o mestre de métodos avançados da prática budista.
(Nota: Os Karmapas, seres que podem olhar simultaneamente para tudo no passado, presente e futuro, da mesma forma como nós olhamos para algo na palma de nossa mão, são uma linhagem de encarnações de mestres da qual o 6º, Thongwa Donden, também músico, foi o responsável pela sistematização da prática litúrgica Karma Kagyu usada nos rituais)
Vale notar que a palavra Rinpoche - que pode ser traduzida do tibetano como “Precioso” – é um título vinculado ao nome de um grande mestre, similar à forma como o título PhD é agregado a um ocidental considerado especialista em várias áreas do conhecimento.
A entrevista
- O senhor praticava meditação antes de receber treinamento formal?
YMR – Sim. Eu tentava praticar embora não tivesse idéia do que era meditação. Às vezes eu entrava na gruta e fazia de conta que meditava, e minha avó ficou muito apreensiva, pois um dia achou que eu tinha me perdido. Ela pediu para as pessoas me procurarem, e finalmente ela me achou na gruta e disse “Uh! Não faça isso de novo!”, mas, (risos) eu fiz mesmo assim e então ela aceitou e disse: “Se você for para essa gruta, tudo bem”. Então eu tinha permissão da minha avó e da minha mãe. Um dia eu estava sentado lá e fingia meditar - eu não tinha idéia de o que era meditação – mas havia aquele mantra “Om Mani Padme Hum”, todos usam esse mantra em nossa aldeia. Nós os chamamos de mantra da compaixão, o mantra da sabedoria da compaixão. (Nota: esse mantra é muito reverenciado pelos seguidores do atual 14º Dalai Lama. Apesar de afirmarem que não tem uma tradução só, afirma-se que significa “Recebemos a jóia da consciência divina, no centro do nosso chakra da coroa”).
E pensei “talvez eu deva dizer isso mentalmente enquanto estiver na gruta.” E fiz isso. E me senti bem melhor . Quando eu tinha 9 anos, pedi a meu pai, que era um grande mestre de meditação - mas eu era tímido para pedir diretamente - pedi à minha mãe para me ajudar a pedir ao meu pai, para me ensinar meditação, e ele aceitou. E a minha primeira pergunta foi: “recitar Om Mani Padme Hum mentalmente é meditar ou não?” Meu pai disse sim. E eu fiquei tão feliz. (risos)
- O senhor ficou feliz por agradar seu pai?
YMR – Fiquei feliz porque eu estava fazendo certo. Isso é uma meditação.
- E qual era a sua idade?
YMR – Eu tinha 9 anos, mas... mas embora eu idealizasse meditar - era curioso quanto à meditação – mas eu tinha ataques de pânico quando eu tinha por volta de 8 anos. Eu desenvolvi pânico, mesmo tendo uma família amorosa, um bom ambiente, mas...o pânico me seguia como uma sombra. Às vezes no inverno temos tempestade, tempestades de neve, e muitas coisas acontecem. Eu tinha medo de desastres naturais, medo de trovões, raios, muitos medos. Às vezes não conseguia dormir. Mas comecei a buscar uma solução para o meu pânico. Então aos 9 anos aprendi meditação com o meu pai, para lidar com o pânico. Recebi instruções maravilhosas, mas não praticava muito. Era um menino preguiçoso. Aos 11 anos mudei para o norte da Ìndia, um local chamado Sherab Ling, um local muito bonito perto de Dharamsala, a residência de S. S. Dalai Lama, a duas horas de Dharamsala, uma estrada esburacada, o que é muito bom para o corpo... exercício gratuito! Sabe aquela poltrona de massagem do aeroporto? Em que a gente coloca um pouco de dinheiro? A estrada esburacada é melhor, é de graça (risos). Então...eu estava em Sherab Ling, e quando tinha 13 anos, estava para começar lá um retiro de 3 anos. Um retiro de meditação. Eu quis muito participar do retiro... mas fiquei tímido para pedir, e pedi ao meu pai, para solicitar a Sua Eminência Tai Situ Rinpoche, o chefe do nosso monastério, para aceitar a minha adesão ao retiro, e meu pai escreveu uma carta solicitando. E Rinpoche me perguntou “você quer mesmo participar? Tem certeza?” E eu disse sim. E ele me aceitou, e tive a oportunidade de participar do retiro de 3 anos. E no primeiro ano de retiro meu pânico piorou. Ficou mais forte. Então eu pensei “Hmm”... Eu era muito infeliz naquele tempo, mas eu ainda tinha 2 anos pela frente. Pensei “Uau, ainda tenho 2 anos! Você quer mesmo passar 2 anos desse jeito? Ou você quer aplicar técnicas de meditação para os ataques de pânico?” E decidi aplicar técnicas de meditação para o meu pânico. E então eu disse para o meu pânico “Olá”, pois normalmente descobri que existem dois modos de o pânico piorar e ficar mais forte. Primeiro, você segue o seu pânico. Você só diz “Sim Senhor” e você acredita no pânico, e em qualquer mensagem que venha do pânico. Você apenas acredita que o mundo é terrível, cheio de problemas. Desse modo o pânico se torna seu chefe, e você se torna escravo do pânico. O segundo problema, é que você não gosta do pânico. Você odeia o pânico... “Êi pânico, saia daí!” E você tenta bloquear o pânico. Você tem pânico do pânico! Tem medo do pânico. Às vezes o medo do pânico é mais forte do que o pânico. E assim o pânico se torna seu inimigo. O que eu descobri é que podemos nos tornar amigos do pânico. E como? Diga “olá!" para ele. Então uso o meu pânico como objeto de meditação. E o pânico se transforma numa meditação. Quando olho para o pânico, ele parece uma bolha, como espuma de barba, sabe? Cheia de bolhas por dentro, mas quando se olha mais fundo, o pânico perde o sentido e se torna uma percepção consciente... espaços...experiência para além da palavra, além dos conceitos. E o pânico passou. Fiquei sentado em meu quarto durante 3 dias, para usar o pânico como objeto de meditação, e depois de 3 dias o pânico passou totalmente. Desde então nunca mais tive pânico. Mas ainda me sinto muito feliz em relação ao meu pânico. Penso que meu pânico é um de meus mestres importantes. Ainda sou agradecido ao meu pânico. Aprendi muita coisa a respeito do meu pânico. Por causa dele estou aqui, e escrevi dois livros: A Alegria de Viver, e o mais novo Joyful Wisdom (Sabedoria Alegre), e nesses livros compartilho a minha experiência com o pânico e como lidar com ele, como transformá-lo. E não somente o pânico. Você pode usar para qualquer outra emoção, depressão, perda de autoestima, raiva, e assim por diante...
Essa postagem foi transcrita, com algumas adaptações, de uma entrevista alegre e despretensiosa concedida pelo jovem mestre Yongey Mingyur Rinpoche e registrada em video, apresentado no site http://vimeo.com/19875915 por Helio Biesemeyer