domingo, 21 de setembro de 2014

Cadê todo mundo?

Quando eu consigo sair da cidade grande, olhando à noite para o céu e vendo aquela infinidade de estrelas juntinhas ocupando tudo,  sempre tenho a sensação de que temos companhia lá fora. Fico encantado, mas vejo que cada um reage diferente. O grande físico Enrico Fermi também reagia diferente e, já que tudo indica que não estamos sozinhos, se perguntou:  “Cadê todo mundo?”. Esse é o chamado Paradoxo de Fermi.

Vamos calcular qual a probabilidade de existir mais outros seres na nossa galáxia...
Um céu estrelado parece imenso, mas tudo o que estamos vendo é a nossa vizinhança. Nas melhores noites estreladas, nós podemos ver até 2.500 estrelas (mais ou menos um centésimo de milionésimo do total de estrelas em nossa galáxia). Quase todas estão a menos de mil anos-luz de nós (ou 1% do diâmetro da Via Láctea). Então, na verdade estamos olhando para isto na foto abaixo:
"Nosso céu noturno é formado por uma pequena parte das estrelas próximas e mais brilhantes dentro do círculo vermelho."
Quando somos confrontados com o assunto de estrelas e galáxias, uma questão que atormenta a maior parte dos humanos é: “há vida inteligente lá fora?” Vamos colocar alguns números nessa questão; se você não gosta de números...
Nossa galáxia tem entre 100 bil
hões e 400 bilhões de estrelas; no entanto, este é quase o mesmo número de galáxias no universo observável. Então, para cada estrela da imensa Via Láctea, há uma galáxia inteira lá fora. No total, existem entre 10^22 e 10^24 estrelas no universo (dez elevado à potência 24, ou seja, dez seguido de 24 zeros!!!) . Isso significa que para cada grão de areia na Terra, há 10.000 estrelas no universo.
O mundo da ciência não está em total acordo sobre qual porcentagem dessas estrelas são parecidas com o Sol (similares em tamanho, temperatura e luminosidade). As opiniões tipicamente vão de 5% a 20%. Indo pela mais conservadora (5%) e o número mais baixo na estimativa total de estrelas (10^22), isso nos dá 500 quintilhões, ou 500 bilhões de bilhões de estrelas similares ao Sol.
Também há um debate sobre qual porcentagem dessas estrelas similares ao Sol poderiam ser orbitadas por planetas similares a Terra (com condições parecidas de temperatura, que poderiam ter água líquida e que poderia sustentar vida similar à da Terra). Alguns dizem que é até 50%, mas vamos ficar com os conservadores 22% que apareceram em um recente estudo no PNAS. Isso sugere que há um planeta similar à Terra, potencialmente habitável, orbitando pelo menos 1% do total de estrelas do universo: um total de 100 bilhões de bilhões de planetas similares à Terra.
Então existem 100 planetas parecidos com a Terra para cada grão de areia do mundo. Pense nisso na próxima vez que for à praia.
Daqui para a frente, nós não temos outra escolha senão sermos especulativos. Vamos imaginar que, depois de bilhões de anos de existência, 1% dos planetas parecidos com a Terra tenham desenvolvido vida (se isso for verdade, cada grão de areia representaria um planeta com vida). E imagine que em 1% desses planetas avance até o nível da vida inteligente, como aconteceu na Terra. Isso significaria que teríamos 10 quatrilhões, ou 10 milhões de bilhões de civilizações inteligentes no universo observável.
Voltando para a nossa galáxia e fazendo as mesmas contas usando a estimativa mais baixa de estrelas na Via Láctea, estimamos que existem 1 bilhão de planetas similares à Terra, e 100 mil civilizações inteligentes na nossa galáxia. A Equação de Drake traz um método formal para esse processo limitado que estamos fazendo. Ela é um argumento probabilístico usado para estimar o número de civilizações extraterrestres ativas em nossa galáxia Via Láctea com as quais poderíamos ter chances de estabelecer comunicação. 
A SETI (Busca por Inteligência Extraterrestre, na sigla em inglês) é uma organização dedicada a ouvir sinais de outras vidas inteligentes. Se nós estivermos certos e houver 100 mil ou mais civilizações inteligentes na nossa galáxia, uma fração delas estaria emitindo ondas de rádio, ou raios laser, ou qualquer coisa para realizar contato. Então os satélites da SETI deveria estar recebendo sinais de todo tipo, certo? 
Errado. Nunca recebeu. Então vem a pergunta de Fermi: Cadê todo mundo?

Reza a lenda que certo dia no laboratório de Los Alamos, um grupo de jovens cientistas discutia animadamente a possibilidade de vida extraterrena. Concluíram que os extraterrestres deveriam existir, afinal, o Universo é infinito e nós não devemos ser os únicos seres inteligentes em todo esse espaço. Seria então que o físico Enrico Fermi, que estava ouvindo a conversa, teria se levantado em resposta e professado a célebre frase “Então onde eles estão?”. Como Fermi era brilhante e muito famoso, sendo o inventor entre outras coisas do primeiro reator nuclear, desta simples frase nascia o ‘paradoxo de Fermi’, um dos principais argumentos usados para afirmar que nós estamos sozinhos. Segundo ele, se os ETs existem, eles já deveriam ter pousado na frente da Casa Branca.
Há sérios problemas com essa lenda. O principal é que ela indica algo que simplesmente não é verdade: ao contrário do que muitos pensam, Enrico Fermi de fato acreditava na existência de vida extraterrestre. Outro problema não só com essa lenda, mas com o conhecimento popular, é o de que o paradoxo de Fermi serve para provar que ETs inteligentes não existem. Se este fosse o caso, o paradoxo não existiria: ele é justamente um paradoxo porque qualquer resposta que se dê a ele é paradoxal. Seja ela a existência ou mesmo a inexistência de vida extraterrestre inteligente.
Uma versão mais verossímil sobre a origem do paradoxo de Fermi diz que nos anos 50, ainda em Los Alamos, Enrico Fermi estava pensando sobre a vida extraterrestre em seu escritório no andar superior, e embora sempre tenha simpatizado com a idéia, percebeu que as descobertas recentes cada vez mais aceitas da cosmologia indicavam que nosso Universo teria de 8 a 18 bilhões de anos (atualmente, estimativas mais precisas indicam 12 bilhões). Ele notou que com tanto tempo e com tanto espaço, alguma civilização extraterrena não só deveria ter surgido, como também já deveria ter colonizado toda Galáxia. Frustrado com a ausência de evidências que apoiassem essa conclusão, desceu perplexo as escadas para o refeitório lotado de cabeças brilhantes e perguntado em voz alta: “Onde eles estão?”
E ele recebeu uma resposta. Leo Szilard teria retrucado “Eles já estão aqui. Mas chamam a si mesmo de húngaros” (rsrs). Essa era uma referência a uma piada (ou não?) corrente no departamento de física teórica segundo a qual há milhões de anos os marcianos precisaram deixar seu planeta e pousaram no que hoje é conhecido por Hungria. Conseguiram adaptar-se e parecer-se com os macacos falantes que habitavam a Terra, mas três características eram muito fortes para ser escondidas: sua vontade de viajar (húngaros estariam por todo o mundo), sua língua (única e diferente de todas circunvizinhas) e sua inteligência (muitas das melhores mentes de Los Alamos eram húngaras. Incluindo Szilard, Von Neumann). Essa versão sobre a origem do paradoxo de Fermi é mesmo confirmada por Edward Teller, tido como pai de bomba de hidrogênio, e ele mesmo um marciano, digo, húngaro. Será que essa versão do paradoxo de Fermi é pouco conhecida porque os húngaros-marcianos conspiram para que o vazamento do segredo a Fermi não alcance o público? Sem dúvida, a verdade está lá fora…
Em todo caso, notar que o próprio Fermi era um simpatizante da existência de seres inteligentes fora da Terra ilustra perfeitamente a profundidade do paradoxo. Parece uma ironia sem sentido que um simpatizante da idéia de ETs tenha criado um argumento usado por pessoas que não acham ETs muito atraentes, por assim dizer. Mas entender a fundo o paradoxo pode mostrar que seria esperado que um defensor bem-informado e genial da idéia de ETs deveria ter sido o primeiro a enxergar a contradição. Ela é uma contradição, não uma afirmação. Isso deveria ser óbvio, mas infelizmente parece não ser a muitos.
Existem duas respostas principais e óbvias ao paradoxo: ETs inteligentes existem ou simplesmente não existem. Ambas respostas têm sérios problemas, e isso é justamente o que leva a uma contradição, a um paradoxo. Vamos abordar primeiro a resposta mais comum no meio ufológico.
Pois bem, suponha que ETs existam. Mais, que o Universo esteja pululando de civilizações diferentes, com diferentes índoles, objetivos e crenças. As respostas usuais para que nenhuma delas tenha resolvido colonizar a Terra apela para motivações comportamentais, ou seja, algo no comportamento destas civilizações impede que elas nos colonizem de forma óbvia. Essas respostas comportamentais podem ser divididas em três categorias.
A primeira é a de que todas civilizações que dominam a tecnologia de viagem espacial também dominam a tecnologia de se auto-aniquilar. E de que boa parte delas infelizmente acaba aplicando esta última tecnologia, por diversos motivos. A mesma seleção natural que pode ter criado vida inteligente por todo o Universo condena esta vida a uma competição contínua, que leva à guerra, que combinada com tecnologia leva ao apocalipse. Olhando para nossa própria civilização, vemos que esta resposta, embora pouco atraente, parece ser a que possui mais embasamento por experiência.
A segunda categoria, e a que parece ser mais atraente, é a de que as civilizações que não se aniquilaram são capazes de perceber a importância da própria vida e outras baboseiras espirituais ou motivações éticas quaisquer, e assim se importam tanto com a vida que não querem interferir nela. Então, ou elas resolvem não partir para a exploração do Universo e fecham-se em si mesmas para viver em paz e felizes (algo meio zen) ou partem para explorar o Universo mas de forma discreta, procurando sempre evitar quaisquer interferências (algo como ‘Jornada na Estrelas’).
A terceira categoria é a de que ao contrário da anterior, as civilizações que desenvolvem a tecnologia de viagem espacial acabam rapidamente tornando-se desenvolvidas a ponto de perder completamente o interesse por seres atrasados como nós e mesmo dos recursos que planetas como o nosso poderiam oferecer, ao passo que sua presença acabaria tornando-se invisível devido à sua integração com os processos naturais do Universo. Uma idéia sem dúvida muito próxima de ficção científica – de fato, tema de algumas histórias deste gênero. Tais civilizações acabariam ‘transcendendo’. Seu processo de pensamento poderia ser acelerado através da integração de sua biologia com sua tecnologia, e a passagem de tempo subjetiva a eles seria mínima. O que para nós é um segundo, para eles pareceria milênios. E não haveria a menor razão para que eles se interessassem por nós. Eles poderiam estar resumidos à escala nano ou picoscópica, e através de enorme otimização seu processamento de dados e manipulação de energia seria praticamente indistinguível de flutuações quânticas aleatórias, ou simples ruído. Um dos proponentes da resposta transcendental ao paradoxo de Fermi é Ray Kurzweill, famoso inventor e tido como prodígio.
O problema com todas respostas comportamentais é que elas deveriam se aplicar a todas as civilizações, sem absolutamente nenhuma exceção. É possível imaginar que a maioria das civilizações se aniquile, que boa parte transcenda, e que o resto resolva aderir até mesmo a uma benigna ‘Federação dos Planetas’ que siga à risca uma ‘Primeira Diretriz’. Mas com tanto espaço, com tanto tempo, é difícil imaginar que nenhuma civilização tenha ao mesmo tempo desenvolvido tecnologia e vontade de colonizar a Galáxia. Olhando para nós mesmos, o único exemplo de civilização que conhecemos, esse parece ser nosso caminho. Por que não o de outras, de incontáveis outras civilizações? Isso inclui a idéia ingênua de que os ETs estão aqui e se escondem com a ajuda dos governos. Alguns ETs poderiam aderir à idéia mesmo que ela fosse praticável, mas todos, sem exceção, é algo estranho. E uma presença óbvia deveria ser realmente óbvia, não apenas visível aos que simplesmente acreditam.
Uma idéia é a de que uma benigna Federação dos Planetas resolva impedir aqueles que tentem a empreitada de colonizar a Galáxia. Mas isso apenas leva à idéia de guerras espaciais! Seria possível que, como nos filmes, o bem sempre vença? Outro problema: não seria o próprio ato de impedir uma civilização de colonizar outros planetas uma interferência com o curso normal dela? Seria isso o ‘bem’? A ética de tal ‘Federação dos Planetas’ é posta à prova, e sinceramente, não parece ser muito consistente.
O paradigma mais vigente entre cientistas, ainda simpatizantes da idéia de que seres extraterrestres inteligentes existam, é o de que a viagem espacial é muito dispendiosa. Um notável adepto deste paradigma foi Carl Sagan. Essa idéia explica porque ele defendeu por toda a vida a possibilidade de existência de vida extraterrestre, ao mesmo tempo em que mostrou-se cético com relação à alegações de que OVNIs seriam naves extraterrestres. Isso também justifica sua defesa apaixonada – e com sucesso – do SETI. Se os ETs não viajam, eles ainda podem se comunicar – o que é relativamente pouco dispendioso – e não custa muito tentar ouvir.
Mas mesmo a idéia defendida por Sagan tem problemas, e problemas sérios. O que freqüentemente se fala, principalmente entre ufólogos, é que dizer que a viagem espacial é excessivamente dispendiosa é limitar o avanço de eventuais civilizações ETs ao nosso próprio estado atual. Além disso, nada indica que nosso estado atual de tecnologia seja definitivo. Incrivelmente, estes são argumentos razoáveis, mesmo a demonstrações de quanta energia seria utilizada em tais viagens. Hoje em dia nós usamos mais energia em um ano do que nossos antepassados usariam em toda uma vida. Mas há um argumento ainda mais decisivo contra a idéia de que a viagem espacial não seria prática.
Já em 1970, o astrônomo Michael Hart argumentou que mesmo a 0,1c (um décimo da velocidade luz, ou 30.000Km/s) seria possível cruzar toda Galáxia em poucos milhões de anos. No ano passado, outro astrônomo, Ian Crawford, publicou na Scientific American um artigo ainda mais incisivo: com nossa tecnologia atual, poderíamos alcançar a estrela mais próxima de nós, Alfa do Centauro, em 100 anos. Supondo que quando chegássemos lá levássemos 400 anos para criar uma segunda onda de colonização com duas naves para outras duas estrelas próximas e assim sucessivamente – estimando assim um período de 500 anos para cada onda de colonização – levaríamos de 5 a 50 milhões de anos para colonizar toda a Galáxia. Ou seja, com nossa tecnologia atual e muito esforço já poderíamos nos fazer notar por toda Galáxia em um piscar de olhos – em termos astronômicos, com um Universo de 12 bilhões de anos de idade. A viagem espacial pode ser dispendiosa, mas é difícil imaginar que isto limite uma civilização à proximidade de seu planeta por tempo indefinido, ainda mais quando sabemos que as estrelas não têm vida eterna. Algo dispendioso não é algo impossível.
Uma classe diferente de resposta é o ‘Grande Filtro’, que situa-se no limiar de afirmar que ETs não existem. Eles existem, ou teriam existido, e espalhado por todo Universo máquinas destinadas a exterminar qualquer civilização que se faça muito notada ou que resolva colonizar a Galáxia. Qual o objetivo deste ‘Grande Filtro’? Não se sabe ao certo, e em verdade, não importa. A civilização que criou este ‘Grande Filtro’ pode ter uma lógica e motivações próprias, incompreensíveis a nós, mas com efeitos claros e decisivos sobre todos que resolvam se fazer notar por toda Galáxia. Mas, e quanto à civilização que criou o ‘Grande Filtro’? Onde ela está? Talvez ela mesma tenha se extinguido, e suas máquinas continuem funcionando. Não se sabe, porém embora pareça muito estranha, a idéia do Grande Filtro é uma das que mais fazem sentido para explicar o Grande Silêncio. O Grande Problema com o ‘Grande Filtro’ é que não parece funcionar muito: nós já podemos nos fazer notar razoavelmente bem, estamos prestes a colonizar outros planetas, e nada apareceu para nos aniquilar. Até o momento, pelo menos.
Enfim, não há nenhuma resposta completamente satisfatória que explique porque, se os extraterrestres existem, nós não os notemos de forma óbvia. Podemos cogitar sobre o comportamento de tais ETs, mas é inviável imaginar que não exista nenhuma exceção. Podemos ainda imaginar um Grande Filtro, mas ele ainda não nos filtrou. Podemos constatar o quanto é difícil viajar entre as estrelas, mas isso certamente não é algo impossível. O paradoxo de Fermi revela sua profundidade: Se eles existem, onde eles estão?
Muitas vozes se levantam agora e dizem: “Eles não estão em lugar algum”. Esta é uma resposta simples, muito aceita por pessoas bem-informadas e razoavelmente satisfatória. Seres extraterrestres inteligentes podem simplesmente não existir. É preciso lembrar entretanto que ela também tem sérios problemas, porque é uma conclusão que dificilmente pode ser provada, e nada indica sequer decisivamente para ela até o momento.
O paradoxo de Fermi é um paradoxo justamente porque “eles” deveriam existir segundo nosso conhecimento científico, que o próprio Fermi conhecia bem assim que a ciência tornou-se suficientemente sólida para permitir pensamentos sobre o tema e incrivelmente, continua a apoiar a idéia até hoje, cinco décadas depois. Não sabemos de nada que impeça a existência de outras civilizações, e como sempre foi regra, o que não é impossível geralmente acaba ocorrendo na natureza, mesmo que seja um tanto improvável. Mas talvez ocorra apenas uma vez se for algo excessivamente improvável. E nós seríamos esta única vez.
Há algumas décadas, a maioria dos que advogavam a raridade de inteligência no Universo acreditava que sistemas solares seriam raros, formados por processos talvez mesmo catastróficos, como por exemplo uma estrela passando perto ou – pasmem – chocando-se com outra. As chances de que isso ocorra são ínfimas, e se os sistemas planetários tivessem origem catastrófica, deveriam ser de fato raríssimos. Mas recentemente, a detecção de planetas extrasolares tornou-se possível e mesmo comum, e nós conhecemos mais planetas fora de nosso sistema solar do que dentro dele. Isto é algo histórico: uma grande evidência a favor do princípio de Copérnico, segundo o qual nós não somos extraordinariamente especiais, o que deve incluir nossa inteligência. A descoberta de diversos planetas extrasolares praticamente aniquilou a idéia de formação catastrófica dos sistemas planetários, e hoje em dia hipóteses evolutivas de formação, como uma própria conseqüência da formação de estrelas são dominantes. Devem existir quase tantos sistemas planetários na Galáxia quanto existem estrelas, e existem centenas de bilhões de estrelas em nossa Galáxia.
Assim, um dos principais argumentos sobre nossa singularidade passou a ser nossa Lua. Hoje acredita-se que nossa Lua formou-se não só por um processo catastrófico – o choque de um meteoro com a Terra – mas de um processo com características determinadas extremamente limitadas, e portanto algo raríssimo. De fato, nosso sistema Terra-Lua mal pode ser chamado de um planeta e um satélite, pois está próximo de algo que realmente deve ser muito raro: um sistema de planetas duplo, que ainda por cima situa-se na ecosfera de uma estrela.
Se a colisão que teria formado nossa Lua tivesse sido levemente diferente, a Lua poderia ter escapado ou boa parte dela teria caído de novo na Terra e ela seria bem menor. Ou poderiam existir várias luas menores. Nenhum outro planeta de nosso sistema solar tem um satélite que pode ser comparado ao que a Lua é para a Terra.
E a Lua é importantíssima para a vida como nós a conhecemos. Ela estabiliza o eixo de rotação de nosso planeta, impedindo que os pólos gélidos tornem-se equadores quentes a todo momento. Ela é a grande responsável pelas marés intensas que temos, que podem ter sido decisivas para a passagem da vida do mar para a terra. Ela levou a dose exata de massa da Terra para que nosso planeta tivesse placas tectônicas que se movem com relativa rapidez, o que contribui – e muito – para que tenhamos grandes continentes e grandes mares, que se movimentam e aceleram grandemente o processo de evolução. Existem incontáveis outros fatores pelos quais devemos à Lua nossa existência, e talvez os povos antigos estivessem certos ao venerá-la. Muitos cientistas acreditam que a Lua é a grande responsável por nossa existência. E se a formação da Lua foi fruto de um enorme acaso, algo raríssimo, então vida inteligente como nós deve ser igualmente raríssima.
Poderíamos nos estender sobre os diversos aspectos que podem nos fazer únicos, mas a maioria deles deve mudar com o tempo, à medida que novas descobertas sejam feitas. Isso não indica que são inválidos, nós devemos ser realmente especiais, mas é de toda forma praticamente impossível provar que a vida extraterrestre inteligente não existe. Podemos observar que não há prova de que ela existe a despeito de intensas buscas neste sentido, e podemos descobrir o quão raras foram as condições que permitiram o nosso surgimento.
Mas como Sagan imortalizou em uma célebre máxima, “Se nós estamos sozinhos, o Universo seria um grande desperdício de espaço”. O Universo é muito imenso, mesmo nossa Galáxia já é muito imensa, e existiu há tanto tempo para que mesmo uma possibilidade ínfima leve a dezenas, talvez centenas de civilizações a existir. Mesmo limitando o conceito de civilização a algo próximo de nós mesmos. Isso pode ser criticado como uma brincadeira com números grandes, mas quando falamos de nosso Universo, essa brincadeira deve ser levada a sério. Nosso Universo é muito grande, e é muito velho – em termos biológicos. A despeito de novas descobertas relativas à nossa singularidade, e a despeito das que possam surgir, a descoberta recente a respeito da quase onipresença de sistemas planetários contrabalança o que parecia um jogo ganho. Em verdade, no momento o jogo deve estar pendendo justamente para o lado oposto.
Os extraterrestres deveriam existir. Mas se eles existem, eles deveriam estar aqui de forma óbvia. Eles não estão aqui de forma óbvia. Entender a perplexidade que levou Fermi a perguntar “Onde eles estão?”, perplexidade que resiste a inúmeras descobertas e mesmo revoluções em diversos campos da ciência relacionados nestas cinco décadas, é entender o que deve ser um dos maiores enigmas que a ciência do século XX nos deixou. Um paradoxo ao qual qualquer resposta tem sérios problemas, e ao qual a resposta verdadeira deve portanto ser histórica e em si uma enorme revolução sobre nossa posição no Universo. Afinal, “onde eles estão?”

domingo, 20 de julho de 2014

O ciclo de sete anos

Em postagens passadas falamos muito do número 7 e da sua influência no mundo em que vivemos. Mesmo que não tivéssemos falado, qualquer pessoa atenta já teria percebido a sua influência nas vibrações, cores do espectro, notas musicais, medicina oriental, teosofia, alquimia, e por aí afora.
No tempo da nossa existência esses ciclos também existem.

"A vida tem círculos de sete anos, ela se move em círculos de sete anos exatamente como a terra faz uma rotação em seu eixo em vinte e quatro horas. Ninguém sabe porque não são nem vinte e cinco nem vinte e três horas. Não há nenhum jeito de se responder isso. É simplesmente um fato. Assim, não me pergunte porque a vida se move em círculos de sete anos. Eu não sei. O máximo que eu sei é que ela se move em círculos de sete anos. E se você compreender esses círculos de sete anos, você compreenderá uma grande coisa sobre o crescimento humano.
Os primeiros sete anos são os mais importantes porque os alicerces da vida estão sendo assentados. É por isso que todas as religiões estão muito preocupadas em agarrar as crianças o mais rápido possível. Os judeus circuncidam as crianças. Que bobagem! Mas eles estão carimbando a criança como uma judia. Essa é uma maneira primitiva de carimbar. Ainda se faz isso com o gado aqui nas redondezas.  
Aqueles primeiros sete anos são os anos em que você é condicionado, é preenchido com todos os tipos de idéias que irão atormentá-lo ao longo de toda a sua vida, que irão distraí-lo de sua potencialidade, que irão corrompê-lo, que nunca irão lhe permitir ver claramente. Elas sempre virão como nuvens diante de seus olhos e irão fazer com que tudo fique confuso. As coisas são claras, muito claras. A existência é absolutamente clara. Mas os seus olhos têm camadas e mais camadas de poeira. 
E toda essa poeira foi arranjada nos primeiros sete anos de sua vida, quando você era tão inocente, tão confiante, que qualquer coisa que lhe fosse dita você aceitava como sendo verdadeira. E mais tarde, será muito difícil você descobrir tudo aquilo que entrou em seus alicerces. Terá se tornado quase parte de seu sangue, ossos, de sua própria medula. Você perguntará mil outras questões, mas você nunca perguntará a respeito dos alicerces básicos de suas crenças. 
A primeira expressão de amor para com a criança é deixá-la absolutamente inocente em seus primeiros sete anos, sem condicionamento, deixá-la por sete anos completamente selvagem, uma pagã. Ela não deveria ser convertida ao hinduismo, ao islamismo, ao cristianismo. Qualquer um que esteja tentando converter a criança, não tem compaixão, é cruel, está contaminando a própria alma de um viçoso recém-chegado. Antes mesmo que a criança tenha formulado perguntas, ela já terá recebido respostas com filosofias , dogmas e ideologias pré-fabricadas. Essa é uma situação muito estranha. A criança não perguntou a respeito de Deus e você já está lhe ensinando.  Por que tanta impaciência? Espere!
 Se algum dia a criança demonstrar interesse por Deus e começar a perguntar a respeito, então tente dizer a ela não apenas a sua idéia sobre Deus, porque ninguém tem qualquer monopólio. Coloque diante dela todas as idéias de Deus que estiveram presentes em diferentes povos, em épocas diferentes, por religiões, culturas e civilizações diferentes. E lhe diga: 'Você pode escolher dentre essas aquela que mais lhe atrai. Ou você pode inventar a sua própria, se nenhuma estiver adequada. Se todas lhe parecerem defeituosas, e você achar que pode ter uma idéia melhor, então invente a sua própria. Ou se você achar que não há jeito de inventar uma idéia sem falhas, então abandone toda essa história, ela não é necessária. Um homem pode viver sem Deus.' 
Não há qualquer necessidade de que o filho tenha que concordar com o pai. Na verdade parece muito melhor que ele não tenha que concordar. É assim que a evolução acontece. Se toda criança concordar com o pai, então não haverá qualquer evolução, porque o pai terá concordado com seu próprio pai, e todo mundo estará no ponto em que Deus deixou Adão e Eva: nus e expulsos do jardim do Éden. Todo mundo estará lá. O homem tem evoluído porque os filhos têm discordado de seus pais, dos pais de seus pais e de todas as tradições. Toda essa evolução é uma tremenda divergência com o passado. Quanto mais inteligente você for, mais você irá discordar. Mas os pais valorizam as crianças que concordam e condenam as que discordam.
Até os sete anos, se a criança puder ser deixada inocente, não corrompida pelas idéias dos outros, assim tornar-se-á impossível distraí-la de seu crescimento potencial.Os primeiros sete anos da criança são os mais vulneráveis. E elas estão nas mãos dos pais, dos professores, dos padres....
Como defender as crianças dos pais, dos padres e dos professores é uma questão de tamanha proporção que parece quase impossível de se fazer. Não é uma questão de ajudar a criança. A questão é proteger a criança. Se você tiver uma criança, proteja-a de si mesmo. Proteja a criança dos outros que possam influenciá-la, pelo menos até os sete anos, proteja-a. A criança é como uma pequena plantinha, fraca e suave. Um simples vento forte pode destruí-la, qualquer animal pode comê-la. Você põe um fio protetor ao redor dela, mas não a aprisiona, você está simplesmente protegendo-a.Quando a planta estiver maior, o fio será removido.
Proteja a criança de todo tipo de influência de modo que ela possa permanecer ela mesma. E isso é só uma questão de sete anos, porque então o primeiro círculo estará completo. Aos sete anos ele estará bem enraizado, centrado, forte o suficiente. Você não sabe o quanto uma criança de sete anos pode ser forte porque você só tem visto crianças corrompidas. Elas carregam os medos e a covardia de seus pais, mães e familiares. Elas não são elas mesmas.
Se uma criança permanecer sem ser corrompida por sete anos... Você ficará surpreso ao encontrar tal criança. Ela será tão afiada como uma espada. Seus olhos serão claros, seus insights serão claros. E você verá nela uma tremenda força que você não poderá encontrar nem mesmo num adulto de setenta anos.
Se você é um pai (ou mãe), você precisará muito dessa coragem para não interferir. Abra portas para direções desconhecidas de modo que a criança possa explorá-las. Ela não conhece o que ela tem dentro dela, ninguém sabe. Ela terá que tatear no escuro. Não faça com que ela tenha medo do escuro, não faça com que ela tenha medo do fracasso, não faça com que ela tenha medo do desconhecido. Dê a ela suporte. Quando ela estiver indo para uma jornada desconhecida, ofereça a ela todo o seu suporte, com todo o seu amor, com todas as suas bênçãos. 
Não deixe que ela seja afetada pelos seus medos. Você pode ter medos, mas mantenha-os consigo mesmo. Não descarregue esses medos em cima da criança, porque isso será interferência.
Depois dos sete anos, no próximo círculo de sete anos, dos sete aos quatorze, algo novo é acrescentado à vida: os primeiros alvoroços da energia sexual da criança. Mas elas são apenas uma espécie de ensaio.
Ser pai é uma tarefa difícil. Assim, a não ser que você esteja pronto para assumir tal tarefa difícil, não se torne um pai. As pessoas simplesmente seguem se tornando pais e mães sem saber o que estão fazendo. Você está trazendo uma vida à existência e todo o cuidado do mundo será necessário.
Agora, quando a criança começa a brincar com seus ensaios sexuais, é o tempo em que os pais mais interferem, porque foi assim que fizeram com eles. Tudo o que eles sabem é o que foi feito com eles, assim eles seguem fazendo o mesmo com as suas crianças. As sociedades não permitem ensaio sexual, pelo menos não permitiram até o século XX, exceto nas duas e três últimas décadas em alguns países muito avançados. Agora já existem escolas mistas para as crianças, mas em um país como a Índia, mesmo agora, a educação mista começa a surgir apenas no nível universitário.
O menino de sete anos e a menina de sete anos não podem estar no mesmo internato. E este é o momento para eles, sem qualquer risco, sem perigo de gravidez, sem que quaisquer problemas surjam para suas famílias; este é o momento em que lhes deveriam ser permitidas todas as brincadeiras. 
Sim, isso terá uma conotação sexual, mas será só um ensaio, não se trata de um drama teatral verdadeiro. E se você não permitir a eles nem mesmo esse ensaio, de repente então, um dia a cortina se abrirá e o verdadeiro drama começará... E eles não saberão o que está acontecendo e não haverá nem mesmo aquela pessoa escondida no palco para lhes soprar o que devem fazer. Você terá bagunçado a vida deles completamente.
Esses sete anos, o segundo círculo da vida, são significantes como um ensaio. Eles se encontrarão, se misturarão, brincarão e se conhecerão. E isso ajudará à humanidade a se livrar de quase noventa por cento das perversões. Se às crianças dos sete aos quatorze for permitido estarem juntas, nadarem juntas, estarem nuas juntas, noventa por cento das perversões e noventa por cento das pornografias irão simplesmente desaparecer. Quem irá dar atenção a essas coisas?
Quando um garoto conheceu tantas garotas nuas, que interesse uma revista tipo Playboy poderá ter para ele? Quando uma garota tiver visto tantos garotos nus, eu não vejo qualquer possibilidade de existir curiosidade a respeito do outro. Isso simplesmente desaparecerá. Eles irão crescer juntos naturalmente, não como duas espécies diferentes de animais. É assim que eles crescem agora, como duas espécies diferentes de animais. Eles não pertencem à mesma espécie humana, eles são mantidos separados. Mil e uma barreiras são criadas entre eles, e não lhes permitem qualquer ensaio de sua vida sexual que está chegando...
Se você tiver feito o dever de casa direitinho, se você tiver brincado com sua energia sexual exatamente com o espírito de um desportista (e naquela idade este é o único espírito que você poderia ter), você não se tornará um pervertido, um homossexual.  Todo tipo de coisas estranhas não virão à sua cabeça, porque você está se movendo naturalmente com o outro sexo e o outro sexo está se movendo com você. Não haverá qualquer bloqueio e você não estará fazendo nada errado com quem quer que seja. Sua consciência estará clara porque ninguém pôs nela idéias do que é certo e do que é errado. Você simplesmente está sendo o que você é. 

Dos quatorze aos vinte e um o seu sexo amadurece. E isso é significante para se entender: se o ensaio tiver sido bom no período dos sete aos quatorze quando o sexo amadurece, acontece uma coisa muito estranha que você nem mesmo deve ter pensado a respeito, porque não lhe foi dada a oportunidade. Eu disse a você que o segundo círculo de sete anos, dos sete aos quatorze, deu a você um vislumbre de antes da peça teatral. O terceiro círculo de sete anos da a você um vislumbre do que vem depois.Você está ainda com garotas ou garotos, mas agora uma nova fase começa em seu ser: você começa a se apaixonar.
Não é ainda um interesse biológico. Você não está interessado em procriar, você não está interessado em se tornar marido ou esposa. Esses são os anos dos jogos românticos. Você está mais interessado na beleza, no amor, na poesia, na escultura, que são fases diferentes de romantismo. 

Dos vinte e um aos vinte e oito é um tempo em que eles podem se acertar. Eles podem escolher um companheiro. E eles são capazes de escolher agora, através de toda a experiência dos dois círculos passados eles podem escolher o companheiro certo. Não há mais ninguém que possa fazer isso por você. Isso é algo como um pressentimento.  Nenhuma aritmética, nenhuma astrologia, nenhuma quiromancia, nenhum I-Ching poderão fazer isso. 
Isso é um pressentimento: entrando em contato com muitas, muitas pessoas, de repente alguma coisa dá um clique que nunca deu com qualquer outra pessoa. E isso clica com tanta certeza e tão absolutamente, que você não pode nem mesmo duvidar. Mesmo se você tentar duvidar, você não conseguirá. A certeza é tão tremenda. Com esse clique vocês se acertam. 
Entre os vinte e um e os vinte e oito, em algum lugar, se tudo correr bem do jeito que eu estou dizendo, sem interferência de outros, então vocês se acertam. E o período mais agradável da vida vem dos vinte e oito aos trinta e cinco: o mais alegre, o mais pacífico e harmonioso, porque duas pessoas começam a se derreter e a se fundir uma com a outra. 

Dos trinta e cinco aos quarenta e dois, um novo passo, uma nova porta se abre. Se até os trinta e cinco você sentiu profunda harmonia, uma sensação orgástica e tiver descoberto a meditação através disso, então, dos trinta e cinco aos quarenta e dois vocês ajudarão um ao outro a ir mais e mais fundo na meditação sem sexo, porque o sexo neste ponto começa a parecer infantil, juvenil. Quarenta e dois anos é o tempo certo quando a pessoa deveria ser capaz de saber exatamente quem ela é.

Dos quarenta e dois aos quarenta e nove ela vai mais fundo e mais fundo na meditação, mais e mais para dentro de si mesmo, e ajuda o companheiro no mesmo caminho. Eles se tornam amigos. Não mais existe marido e não mais existe esposa. Esse tempo já passou. Isso já deu a sua riqueza para a sua vida. Agora existe alguma coisa mais alta, mais alta que o amor. Isso é amizade, um relacionamento de compaixão para ajudar o outro a ir mais fundo dentro de si mesmo, a se tornar mais independente, a se tornar mais só, como duas árvores altas, separadas mas ainda próximas uma da outra, ou dois pilares num templo suportando o mesmo teto, estando tão próximos e tão separados, tão independentes e tão sós. 

Dos quarenta e nove aos cinqüenta e seis essa solitude se torna o foco de seu ser. Tudo no mundo perde o significado. A única coisa significante que permanece é essa solitude.
Dos cinqüenta e seis aos sessenta e três você se torna totalmente o que você está para ser: o florescimento potencial. 
Dos sessenta e três aos setenta você começa a ficar pronto para deixar o corpo. Agora você sabe que não é o corpo, você sabe que também não é a mente. O corpo era conhecido como separado de você em algum lugar quando você tinha trinta e cinco anos. Que a mente está separada de você foi conhecido em algum lugar quando você tinha quarenta e nove anos. Agora, tudo mais foi deixado de lado exceto a auto observação. Só a pura consciência, a chama da consciência permanece com você, e isso é a preparação para a morte.
Setenta é a duração de vida natural para o homem. E se as coisas se moverem em seu curso natural, então ele morre com tremenda alegria, em grande êxtase, sentindo-se imensamente abençoado porque a sua vida não foi sem significado e que, pelo menos, ele encontrou o seu lar. E por causa dessa riqueza, dessa realização, ele é capaz de abençoar toda a existência. 
 Só por estar perto de tal pessoa, quando ela está morrendo, é uma grande oportunidade. Você sentirá, na medida em que ele deixa o corpo, algumas flores invisíveis caindo sobre você. Embora você não possa vê-las, você poderá senti-las."
Após os 70 anos, deve começar tudo de novo...

Osho - From Darkness to Light - tradução: Sw.Bodhi Champak

domingo, 29 de junho de 2014

O Eneagrama

Conforme prometemos há tempos, vamos falar do Eneagrama. Ele é um mistério onde a Matemática se encontra com o Desconhecido (aliás aqui entre nós, a Matemática já é o Desconhecido): 
trata-se de uma figura de 9 pontos composta de dois circuitos sobrepostos: um com 3 pontos formando um triângulo e outro com 6 pontos formando uma figura como um circuito aparentemente irregular.
Ele parece ter sido apresentado no Ocidente, em sua forma atual, por Gurdjieff. O conhecimento do funcionamento do eneagrama era um dos mais importantes e era constantemente citado no sistema gurdjeffiano. Parece porém haver evidências de que tal símbolo já fazia parte do conjunto de conhecimentos que antigas ordens sufis utilizavam, ordens estas com as quais Gurdjieff entrou em contato durante seu aprendizado .
Gurdjieff dizia que o ensinamento que jaz sob o eneagrama é “completamente autônomo, independente de outros caminhos”, dando a impressão de permear a humanidade em vários lugares e épocas.
O eneagrama é um símbolo cuja representação gráfica é de um círculo dividido em nove partes. Essa figura encerra relações matemáticas simples e surpreendentes. Quando dividimos a unidade por 3, obtemos a sucessão infinita de 3, em uma dízima periódica, assim:
1/3 = 0.3333…
Se a isso somarmos mais uma terça parte obteremos:
1/3 + 1/3 = 0.6666…
Se repetirmos:
1/3 + 1/3 + 1/3 = 1
que também poderia ser expresso por 0.9999…
Esses 3 números – 3, 6 e 9 – dão origem ao triângulo do eneagrama que representaria a “Lei de Três”, uma das Leis básicas que fazem partem do sistema de Gurdjieff.
A Lei de Três relaciona-se diretamente com o fenômeno da Criação, com o Divino, com Deus, ou que nome tenha. Determina que todos os fenômenos podem ser compreendidos em termos de tríades geradoras que se expressaram em muitas tradições como o Pai-Filho-Espírito Santo, Brama-Shiva- Vishnu na Índia, Keter-Chokma-Binah na Cabala, Isis-Osiris-Horus no Egito, etc..
Essa Lei diz que a geração de todos os fenômenos pode ser explicada pela interação de 3 forças: uma de maior intensidade chamada de ativa que atua sobre a força de menor intensidade do conjunto que recebe o nome de passiva através da modulação e controle de uma força neutralizadora. A força passiva não é estática, ao contrário ela é atuante, mas possui uma intensidade menor que as outras duas. Gurdjieff refere-se à essas três forças usando os nomes de Santa Afirmação, Santa Negação e Santa Conciliação. Citando sua própria definição: “Todo novo surgimento provém de surgimentos anteriores através do ‘jarnel-miatznel’, quer dizer, através de uma fusão, cujo processo se realiza assim: o que está acima se une com o que está abaixo, com a finalidade de realizar por esta união, o que é mediano, o qual se converte, por sua vez em superior para o inferior seguinte, e no inferior para o superior precedente”.
Nada pode acontecer a não ser que essas três forças estejam presentes. Sem a neutralizadora, a ativa e a passiva ficam em inútil oposição e nada de novo pode surgir.
Em nosso estado atual de consciência somos praticamente cegos à força neutralizadora, pois estamos sempre presos a dualidades. Para que sejamos capazes de perceber mais do que essa dualidade é necessário um nível de percepção diferente da realidade (Técnicas do Quarto Caminho).
Costuma-se afirmar que as forças representadas pelos pontos 3, 6 e 9 são derivadas diretamente do Mundo de Uma Lei, ou seja, a própria emanação do Criador (o Raio de Criação). Elas contêm a mesma substância que dará origem ao Mundo de Três Leis. Assim, podemos afirmar que o triângulo dentro do eneagrama simboliza a ação do próprio Absoluto na realidade. O ponto 9 conteria a Força Ativa e representaria a ordem “Seja!”, a ordem primeira que dá origem aos seres; o ponto 3 representaria a harmonização do novo padrão estabelecido e atuaria como a Força Neutralizadora, enquanto que o ponto 6 (Força Passiva) “abriria um espaço” na realidade para que o novo evento pudesse vir à existência. Por isso, se diz que a Lei de Três está diretamente relacionada com a criação e é parte da natureza intrínseca do Raio de Criação em si.
Continuando, se agora dividirmos a unidade por 7 e somarmos outros sétimos sucessivamente, obteremos:
1/7 = 142857142857…
2/7 = 285714285714…
3/7 = 428571428571…
4/7 = 571428571428…
5/7 = 714285714285…
6/7 = 857142857142…
Os números 3, 6 e 9 não aparecem nessas dízimas, e a seqüência dos números sempre é a mesma: 142857. Essa seqüência dá origem a figura que acompanha o triângulo e representa a “Lei das Oitavas”.
Poderemos nos perguntar porque usar o número sete? Ao que parece, este número estaria associado à própria capacidade cerebral de discriminar e classificar os fenômenos, mas como já dissemos neste blog nas postagens a Lei de Três e A Lei de Sete, o 7 está ligado às leis da Manifestação que rege todos os fenômenos criados, da mesma forma que o  3 está ligado à Criação . Vemos a escala de sete notas musicais, as sete cores do arco-íris, os sete dias da semana, etc.. enfim, tudo o que está ligado á evolução dos fenômenos depois de criados.
É interessante observar na figura do Eneagrama que os dois circuitos do 3 e do 7 não se sobrepõem em nenhum ponto, e que os números que pertencem ao circuito da Criação (3, 6 e 9) não aparecem no da Manifestação (142857) e vice-versa. Por que?
Porque após criada, a criatura sai do ventre da Lei de 3, cai no mundo da Lei de 7, da Manifestação, regido pelo 7, ou Lei das Oitavas, e está por conta do acaso, da mecanicidade. Esse deve ser o significado da passagem do Gênesis e de todas as outras tradições "e no sétimo dia descansou", ou seja, O Criador deixou  de atuar diretamente após o sétimo dia em que ficou criando e deixou A Manifestação seguir o seu curso de evolução regido pela Lei do 7. 
A Lei das Oitavas mostra que todo o fenômeno evolui ao longo do tempo numa série de passos seqüenciais e que isso determina uma hierarquização. Essa seqüência no entanto, não é uniforme; existem períodos de aceleração e desaceleração, ou ainda, a energia que impulsiona o surgimento do fenômeno torna-se alternadamente mais forte e mais fraca.
Existe portanto, pontos cruciais nessa seqüência onde energias adicionais devem ser colocadas para que não ocorram desvios que podem acarretar a não concretização do fenômeno. A esses pontos dá-se o nome de “choques”. Quando uma energia adicional não é colocada no ponto de choque (choque adicional) ocorre um desvio na evolução do fenômeno que o distancia da sua concretização.
As Leis que determinam a seqüência dos eventos que compõem um fenômeno qualquer, já eram conhecidas em civilizações antigas e parece ter sido a origem da escala de sete tons da música. Logo, a lei das oitavas pode ser expressa como se segue:

Os choques correspondem aos semitons que representam o momento, no desenrolar do fenômeno, em que uma energia externa deve ser colocada. Se o primeiro choque for dado, a oitava se desenvolve naturalmente sem desvios até o Si. Nesse momento um novo impulso deve ser colocado para que a oitava alcance o próximo Dó. Gurdjieff dizia que qualquer evento dentro da Lei das Oitavas, vai evoluir, desde que a energia para os choques seja introduzida, de Dó para Ré, de Ré para Mi, para Fá, Sol, Lá, Si, Dó, sendo que este último Dó, por sua vez tem as mesmas características do Dó inicial, só que ele vai estar situado em uma dimensão energética ou numa qualidade acima.
A seqüência de dó a dó é chamada de “oitava humana” ou “oitava evolutiva” porque a  partir de um nível de energia inicial, o processo segue através de um conjunto de passos, até atingir um resultado que reflete o ato inicial num outro nível ou qualidade ou energia. Os momentos de choque receberam a energia necessária de tal forma que o processo chega ao Si final. Esse processo ocorre quando temos uma intenção inicial e chegamos ao final obtendo aquilo que havíamos proposto a nós mesmos no início.
Nesse caso, a qualidade do produto final costuma ser apenas suficiente para os padrões cotidianos e encontra-se dentro dos valores normais em termos de eficiência, bom gosto, criatividade, produtividade, etc. dependendo do evento que analisarmos.
Mas, devemos notar que a Lei das Oitavas afirma que o nível de energia que ocorre em um patamar é suficiente para que o Dó evolua para Ré, e para que o Ré evolua para Mi, mas a partir desse ponto, não existe mais energia suficiente intrínseca para que o processo siga em frente na sua exata dimensão. Se a energia adicional não for colocada, o processo tende a parar, o que é muito comum. Se for colocada energia mas esta for insuficiente, o processo pode seguir em frente mas em um nível mais baixo: de Fá passa para Sol, Sol para Lá, Lá para Si e aqui novamente temos uma outra parada. A partir desse ponto o processo decai de novo caso, seja colocada uma energia baixa, e chega a um outro patamar. Esse tipo de evolução de processos costuma ser chamado de “oitava natural”, pois acontece naturalmente onde existe pouca energia para manter o processo. É também chamada de “oitava do homem adormecido”. Aqui o produto será sempre degenerado ou inferior em relação à idéia inicial.
O esquema seria assim:

No entanto, ainda existe uma terceira possibilidade, onde no choque entre Mi e Fá existe um suprimento de energia extra, que é capaz de elevar a oitava para um nível acima em termos de qualidade. Nesse caso, damos o nome à essa oitava de “oitava do Trabalho” ou do “homem consciente”. A qualidade final do processo é notável e situa-se bastante acima do padrão comum. O esquema seria este:

Através dos diagramas fica claro que existem várias possibilidades, onde, por exemplo, o choque entre Mi e Fá pode acontecer e o choque entre Si e Dó não, o que acarreta uma gama muita grande de variações. No entanto, o elemento básico e mais importante que atua como energia nos momentos de choque é a atenção. Muitas vezes será a qualidade da atenção que definirá os processos. É necessário estar atento à evolução do processo e principalmente, estar atento nos momentos chaves, onde o choque se faz presente. E além disso, é necessário ter atenção suficiente para perceber qual a qualidade do choque. Muitas vezes a energia necessária está no próprio ambiente à nossa volta e para percebe-la é necessário desenvolver uma certa sensibilidade à realidade, tentando perceber as nuances e sutilezas. Às vezes é necessário uma energia de ordem física, às vezes, emocional ou intelectual. É necessário treinar essa capacidade de discriminação sutil para que a energia produzida no momento seja realmente útil.
Subir na oitava em ambos os choques não é muito comum. Esse aumento de qualidade e a geração de um produto especial, só é possível para as pessoas muito bem treinadas. É muito raro mas é possível. Todas essas alternativas existem. E isso pode ser aplicado para qualquer evento. Podemos analisar a negociação de um contrato usando esse modelo; estabelecer a planta de um escritório ou de um prédio. Podemos definir com antecipação se queremos um resultado aceitável, razoável ou se queremos um resultado excepcional. E então, devemos definir precisamente quais são os pontos em que deveremos colocar energia para atingir as metas que desejamos. Não adianta colocar energia antes ou depois do momento preciso porque isso não modificará substancialmente o resultado.
Sabemos que a energia necessária entre os pontos Mi e Fá é a metade da necessária entre os pontos Si e Dó. Gurdjieff, em seu livro ‘Relatos de Belzebu a seu neto’, chama ao primeiro choque de “mdnel-inn-mecânico-coincidente” e ao segundo de “mdnel-inn-voluntariamente-realizado”. A diferença entre eles parece residir no fato de que a energia para que o primeiro choque aconteça, tem uma maior chance de ser provida pelo próprio ambiente, mas a energia para o segundo choque deve necessariamente vir da pessoa envolvida com o processo.
“A estrutura do Universo é tal que nenhum processo, causal ou intencional, poderá chegar ao seu termo exceto em condições ambientais planejadas”, afirmava Gurdjieff.
Essa proposição pode ser observada em todos os eventos. Isso acontece porque na vida cotidiana as coisas sempre acontecem por si mesmas e carregam os indivíduos na direção que o acaso determina. “Condições ambientais planejadas” significam ou implicam em atenção para com os atos e suas consequências e para com os sinais que a realidade constantemente nos dá, para que sejamos capazes de escapar da lei do acidente.
Por isso, o estudo da Lei das Oitavas e do eneagrama deve ser sempre experiencial.
Implica em uma atitude de maior responsabilidade frente aos eventos que desencadeamos. Esse estudo nos conduz a perceber os momentos em que devemos estar mais atentos para desencadearmos os choques corretamente, de forma a garantir que o desenrolar do fenômeno aconteça a contento. E ainda, ajuda-nos a cumprir os objetivos que muitas vezes iniciam-se com um forte impulso, mas que aos poucos esmorecem, ou se desviam. Por exemplo, começamos empolgados com a idéia de trabalharmos sobre nós mesmos e terminamos perdidos em ilusões intelectuais, arrogância, etc.. Muito pouco acaba por sobrar do objetivo inicial até que, em momentos determinados, percebemos o quanto nos afastamos dele e tentamos começar tudo de novo.
A necessidade pelo estudo destas Leis era sempre bastante enfatizado na Escola Gurdjieffiana. A compreensão e a utilização consciente de suas premissas eram, em si mesmas, princípios que poderiam libertar o ser dos processos mecânicos da máquina.
Segundo Gurdjieff (1991) o estudo das Leis Cósmicas terminaria por gerar em nós a “propriedade divina” da “imparcialidade”. Para compreender melhor esse termo, sugerimos a leitura do tópico “Técnicas do Quarto Caminho: a Auto-observação”.
Se observarmos o desenho do eneagrama com atenção perceberemos que o segundo choque está, aparentemente no local errado, pois ele deveria estar entre Si e Dó e no entanto, ele aparece entre Sol e Lá.
Na verdade, depois que uma oitava se iniciou, se o primeiro choque for corretamente dado, nesse ponto (número 3) começará o desenvolvimento de uma segunda oitava paralela à primeira, onde o ponto 6 da primeira oitava (choque) corresponderia ao ponto 3 da segunda oitava, o ponto de choque (Ouspensky 1993) – veja figura abaixo. Sempre que iniciamos um evento muitas outras oitavas paralelas se desenvolvem, levando-nos, se tudo der certo, a uma espiral em direção a objetivos cada vez mais amplos. Por exemplo, o estudo de um livro muito difícil mas muito importante, pode gerar uma segunda oitava paralela, por exemplo, da formação de um grupo que se dispõe a estudálo.
Desse estudo outras oitavas podem se desenvolver com as propostas de trabalhos práticos que o grupo pode executar com a finalidade de experienciar as idéias do livro.
Uma outra oitava pode surgir se o grupo decidir fazer um trabalho que leve as idéias do livro para fora do contexto do grupo, por exemplo, através de uma peça teatral. Uma outra oitava surgiria então envolvendo as pessoas que entrariam em contato com essa peça, culminando em outra oitava da formação de um novo grupo de estudos, por exemplo, e assim por diante.

Até agora falamos apenas do percurso “externo” do eneagrama que vai do ponto 1 seqüencialmente até o ponto 9 (ou de Dó a Dó). Existe porém um segundo caminho que é o caminho “interno” cuja seqüência é a interna, ou seja a dos números que formam a dízima periódica 142857. Esse caminho indica a direção e o fluxo de influências dentro da própria estrutura.
O caminho externo, portanto, é fundamentado pela Lei das Oitavas, enquanto que o interno o é, pela Lei de Três. Analisando cada ponto em separado, pelo caminho interno, notamos que ele se liga à outros 2 pontos. Cada um desses pontos irá interagir com o ponto de análise, de forma a complementar o evento, seja mandando ou recebendo energia. O ponto central é o local onde as informações são recebidas, elaboradas e enviadas para o próximo ponto, gerando uma energia adicional que dará condições para a continuação do processo.
Podemos tentar entender isso usando o eneagrama dos dias da semana. Cada dia liga-se, pelo caminho interno, à outros 2 pontos. Assim, na segunda feira eu recebo as influências dos acontecimentos da sexta feira da semana passada e que repercutirão na próxima quarta feira. Portanto, o ponto central é o Neutralizador do processo, uma vez que é aí que se pode interferir e causar modificações, colocando ou retirando energia para que a oitava (caminho externo) se feche.
Se o ponto central é o ponto onde devemos interferir, isso significa que ele representa o momento presente. E neste instante, temos a possibilidade de estarmos interligados com o passado e o futuro ao mesmo tempo. Assim, dizemos que cada evento ocorre simultaneamente no passado-presente-futuro. Devemos compreender que o passado já se foi e que o futuro ainda não existe. Assim sendo, o único momento que realmente conta é o momento presente; ele existe como uma continuação do passado e poderá evidentemente, determinar os acontecimentos futuros. Com a ajuda do eneagrama podemos localizar que lugar do passado e do futuro devemos analisar, interferir ou não, para realizar algo desejado, com eficiência e com o menor dispêndio de energia possível. A energia que sobra, poderá então ser utilizada para os pontos de choque das oitavas paralelas.
O eneagrama também é usado associado à técnica dos “Movimentos” (ver Técnicas do Quarto Caminho). Gurdjieff enfatizava muito essa técnica onde os Movimentos eram feitos em grupo e seguiam o caminho interno, externo ou ambos, dependendo do Movimento. Um exemplo disso é o Eneagrama das Emoções onde a cada ponto se associa um postura física com a geração de uma emoção, sendo que nos pontos de choque as emoções associadas são caracterizadas por uma “estranheza” em termos das emoções do Centro Motor. Geralmente são emoções não-polares e possibilitam a oportunidade do indivíduo desenvolver novas “atitudes emocionais” frente a si mesmo e à realidade. Além da seqüência externa das emoções temos também uma interna, onde observamos como cada emoção influencia e é influenciada pela emoção seguinte.
Além disso, o eneagrama também está associado a cerimônia de “Giros Dervixes” em algumas Ordens Sufis, onde 9 dervixes se situam nos 9 pontos do eneagrama. Os praticantes desse tipo de ritual buscam compreender o eneagrama através da “dança consciente”, pois é durante a prática que surgem a eles os insights básicos que revelam os segredos desse símbolo.
Inicialmente, o eneagrama parece ter sido usado apenas em situações de aprendizado, seja pelos indivíduos envolvidos, por grupos ou para analisar a própria estrutura da Escola ou ensinamento. Atualmente, com a crescente divulgação dos trabalhos de Gurdjieff e de seus discípulos, o eneagrama passou a ser aplicado em outras áreas tais como, a psicologia, com a teoria dos “tipos psicológicos” (com Oscar Ichazo, Claudio Naranjo) ou em atividades empresariais. Porém ele pode ser aplicado em todos os fenômenos observados pois segue leis que permeiam a vida como um todo, apesar de isso ser apenas um subproduto. O principal é o conhecimento de Si Mesmo.
Vários autores se dedicaram intensamente ao estudo desse símbolo e suas aplicações práticas, como por exemplo I.B. Popoff (1978) e J.G.Benett (1983).

domingo, 22 de junho de 2014

O Eclipse solar de 29/04/2014

Na postagem A Cruz Cardinal - Tensão Coletiva à Vista.... falamos dos dois eclipses inseridos nesse período abrangido pela cruz, cujas influências se adicionavam aos seus efeitos da fundo. Resolvemos não postar nada sobre os eclipses, mas mudamos de ideia a partir do fato de que os eclipses, principalmente o solar, agregam um elemento de incerteza e imprevisibilidade nos fenômenos até outubro de 2014. Então vamos falar um pouco para os interessados nos eclipses .
No dia 29 de abril de 2014 (terça feira) ocorreu então o eclipse solar, no grau 8 de Touro, às 3:14 hs, e as tendências desse fenômeno terão validade até 23 de outubro. Touro está ligado à capacidade de mantermos o foco e a persistência, simbolizando uma semente que precisa ser regada e adubada com constância.
Como o próprio fenômeno simboliza algo incomum, o período do eclipse também tende a sinalizar acontecimentos inesperados e reviravoltas. As pessoas podem mudar de comportamento, situações podem se inverter, bem como pode haver descobertas."Como o próprio fenômeno simboliza algo incomum, o período do eclipse também tende a sinalizar acontecimentos inesperados e reviravoltas. As pessoas podem mudar de comportamento, situações podem se inverter, bem como pode haver descobertas."
Por isto, tende a ser uma fase de mexidas (mudanças). E elas tendem a acontecer nos assuntos regidos pelos signos envolvidos com o eclipse - no caso do eclipse solar, Touro - e também no Mapa Astral da pessoa, pelas casas nas quais eles acontecem.
Por exemplo, na Casa nove do Mapa pode ser um indicativo de que o indivíduo precisará se manter fiel (Touro) às suas aspirações (Casa nove), além de fazer algo de concreto por elas. Se ocorrer na Casa doze, pode trazer uma temática do sacrifício (casa doze) que constrói (Touro), como é o caso de estudos que nos obrigam a ficarmos isolados por um tempo (algo ligado à casa doze), a fim de atingirmos um objetivo.
Os eclipses estão dentre os fenômenos astronômicos que mais despertam a curiosidade. Imagine o impacto que o Sol ou a Lua sendo ocultado causava no passado, especialmente quando o eclipse era total. Eclipses ocorrem quatro vezes por ano. Quando a Lua é eclipsada, denomina-se de eclipse lunar. Quando o Sol é ocultado, trata-se de eclipse solar. Os eclipses podem ser de visibilidade total ou parcial. São muito observados na Astrologia Mundial, ramo que se ocupa de previsões para regiões e países. As áreas onde os eclipses são totais são consideradas como mais prováveis de os efeitos astrológicos do eclipse serem mais visíveis. E que efeitos seriam estes?
OCULTAÇÃO PRODUZ DÚVIDAS
O eclipse mexe com a ordem natural das coisas. Quando a Lua era totalmente ocultada, por exemplo, provocava nos povos antigos um misto de angústia e curiosidade. O próprio ato de ocultar está ligado a um mistério. Assim, o significado primordial do eclipse é a incerteza. Tudo parece ficar incerto, em suspense, cerca de três semanas antes e depois do eclipse.
O eclipse também gera uma tensão inconsciente, até por juntar Sol e Lua, dois planetas essenciais na Astrologia. Em razão desta tensão, situações críticas têm mais chance de transbordar. Exemplo: em um relacionamento já com problemas, na época do eclipse pode ocorrer uma crise mais séria. É mais difícil manter a racionalidade (Sol) e o balanço emocional (Lua) neste período, que requer um esforço muito maior para se obter equilíbrio e raciocinar. Há uma forte tendência à precipitação, que pode gerar acontecimentos.
ECLIPSE DA LUA TERÁ VALIDADE ATÉ 8 DE OUTUBRO
Na madrugada do dia 15 de abril ocorreu também um eclipse total da Lua em todo o território brasileiro. Porém, mesmo quando esteve totalmente encoberta pela sombra da Terra, a Lua não desapareceu do céu: apenas ficou menos brilhante e coloriu-se de um tom avermelhado, naquilo que se chama de "Lua vermelha" ou "Lua de sangue". A explicação para o fenômeno tem a ver com o fato de que a atmosfera da Terra atua como uma grande lente, cuja particularidade é espalhar mais a luz azul. Isto explica, por exemplo, porque o Sol fica mais avermelhado ao entardecer.
O fenômeno gerou discussão na Internet, tanto pelo tom da Lua, como por ser o início de uma tétrade - que é um conjunto de quatro eclipses totais da Lua em um espaço de dois anos. A tétrade chama a atenção porque não ocorre com frequência. No nosso século, acontecerão somente oito. A de abril de 2014 foi a segunda. A terceira irá ocorrer entre os anos de 2032 e 2033. Todo fenômeno astronômico que não é frequente produz expectativas, especulações e superstições também, especialmente esta tétrade que coincide com o Pessah Judaico, cujo calendário é sabidamente lunar.
O eclipse lunar de 15 de abril ocorreu no grau 25 de Áries. Seus efeitos durarão até a ocorrência do próximo eclipse lunar, no dia 8 de outubro."O eclipse lunar de 15 de abril ocorreu no grau 25 de Áries. Seus efeitos durarão até a ocorrência do próximo eclipse lunar, no dia 8 de outubro."
Ao ativar o eixo Áries/Libra, vai levantar reflexões ligadas à individualidade, autonomia e coragem, ou seja, aquilo que depende de você (Áries), mas também sobre relacionamentos e parcerias (Libra). Como se trata de um eclipse lunar, instigará a ter novas posturas e atitudes em relação a isto. Em razão de o Sol estar em Áries, cobrará mais aquilo que depende de você, ao estilo: "o que eu posso/devo fazer para mudar isto?".
COMO SE PREPARAR PARA UM ECLIPSE?
Como o eclipse é detonador de situações de crise, pode ser potencialmente complicado para circunstâncias precárias e que envolvam algum tipo de dependência. Por isto, pede mais cuidado e que se evitem comportamentos imprudentes, a menos que você tenha aquilo que se chama de plano de contingência para lidar com imprevistos.
Por exemplo, se você está alugando um quarto e a relação com o proprietário não estiver muito boa, pode ser que de uma hora para outra se agrave, devido a algum acontecimento que vai gerar divergência. E você poderá ter que procurar um novo lugar. Se você estiver no limite das finanças, esta situação ficará ainda mais complicada se você não puder fazer a mudança de pronto ou não tiver programado para onde ir.
Devido ao aumento da tensão emocional em época de eclipse, pode ser um bom momento para procurar por terapia e aconselhamento."Devido ao aumento da tensão emocional em época de eclipse, pode ser um bom momento para procurar por terapia e aconselhamento."
No entanto, tudo é mais delicado, também. É como se o inconsciente estivesse em ebulição e as coisas não ficassem totalmente claras.
DIFERENÇAS DE SIGNIFICADO ENTRE ECLIPSE SOLAR E LUNAR

No eclipse lunar, a Lua é eclipsada. A Lua para a Astrologia tem a ver com o passado e com o sentido de segurança, é isto que fica mais precário nesta fase. As pessoas ficam com mais medo e mais reativas. Saber desta maior insegurança pode ser um importante diferencial para lidar com pessoas e situações. O eclipse lunar também pode fazer as pessoas saírem da sua zona de segurança (Lua). Algo em que se apoiavam ou com o que contavam pode ser temporária ou definitivamente alterado. Exemplo: a empregada da casa comunica que vai precisar pedir demissão porque quer morar com a filha em outro estado. Independente de como estava a relação, o sentido do habitual (Lua) é que está sendo mexido.
No eclipse solar, o Sol é que fica obscurecido. O Sol, na Astrologia, rege o futuro e o poder de escolha. A Lua se sobrepõe ao Sol, por isto eclipses solares podem trazer um retorno do passado."No eclipse solar, o Sol é que fica obscurecido. O Sol, na Astrologia, rege o futuro e o poder de escolha. A Lua se sobrepõe ao Sol, por isto eclipses solares podem trazer um retorno do passado."
É possível que seja a volta de um antigo amor ou o retorno de algum hábito de outra época (positivo, como caminhar ou correr, ou negativo, como fumar). O ex-patrão pode fazer uma proposta de retorno. A pessoa pode resolver sair do aluguel e voltar a morar com os pais. Ou então eventos menores, como possibilidade retomar um contato com um velho amigo que aparece para visitar.
Apesar de o eclipse ter uma atuação particularmente forte nas imediações da data em que ocorre, em Astrologia se diz que um eclipse ainda tem cerca de seis meses para se manifestar em pequenos ou grandes eventos, até que venha outro de mesma natureza (solar ou lunar), ocorrendo em novo grau, acionando a mesma casa ou não.

Extraído do site Constelar

domingo, 15 de junho de 2014

A Roda Da Vida - 2

Na postagem A Roda da Vida falamos deste conceito no budismo. Hoje vamos continuar a partir de textos didáticos e simples dos lamas Samten e Chagdud compilados por Kalma Tenpa Dharguye:

A Roda da Vida (sânsc. Bhavachakra), também conhecida com a Roda da Existência, Roda do Devir e do Vir-a-ser, foi criada pela extinta escola Sarvastivada, precursora do buddhismo Mahayana. Este diagrama geralmente é encontrado nas portas de entrada dos monastérios tibetanos. Suas ilustrações representam simbolicamente a os doze elos da existência interdependente, os seis reinos da existência cíclica e os três venenos da mente. Segundo a tradição, a Roda da Vida foi desenhada pela primeira vez na época do Buda Shakyamuni. Depois de pedir um conselho ao Buda, o diagrama teria sido desenhado por ordem do rei Bimbisara de Magadha. Ele o enviou ao rei Udayana em retribuição a um manto de jóias preciosas que tinha recebido de presente. O rei Udayana teria atingido uma profunda realização espiritual após estudar este diagrama.

A assustadora figura que segura a roda é Yama, o demônio da morte da mitologia indiana. Aqui, sua terrível presença simboliza a impermanência; nenhum ser vivo pode escapar de suas garras. Entretanto, o Buda está flutuando no céu e apontando para a lua cheia; isto representa que os seus ensinamentos apontam o caminho para a liberação.

A maioria das pessoas vive negando a morte; praticantes budistas vivem com a constante consciência de sua existência. A morte, para eles, é uma poderosa diretriz para encontrar o significado essencial da vida. Na prática Vajrayana tibetana, os símbolos da morte — copas de crânio, tambores de crânio, trombetas de fêmur, malas [rosários] de osso, dançarinos em indumentárias que simbolizam esqueletos — nos relembram nitidamente de sua proximidade. A utilização de tais implementos durante os rituais não quer dizer que os praticantes Vajrayana sejam insensíveis à morte, ou que não se aflijam com a morte de familiares e amigos, porém o cheiro e a textura de ossos envelhecidos, por exemplo, evocam o pensamento: "Sim, eu também terminarei como ossos espalhados ou cinzas num cemitério. Possa eu usar bem este corpo e não desperdiçar o tempo que me resta". (Chagdud Khadro, Práticas Preliminares do Budismo Vajrayana)

Na borda da roda, doze ilustrações representam os “Doze elos da existência condicionada”:

3 ELOS DA VIDA PASSADA:

  • Uma velha mulher cega, andando com uma bengala, representa a ausência de visão ou ignorância;
  • Um oleiro fazendo um pote representa as formações mentais;
  • Um macaco pulando de galho em galho representa a consciência;
7 ELOS DA VIDA ATUAL:

  • Um barco com duas pessoas representa o nome e forma;
  • Uma casa com seis janelas representa o conjunto dos seis sentidos;
  • Um casal se abraçando representa o contato;
  • Um homem ferido por uma flecha no olho representa a sensação;
  • Um homem tomando uma bebida representa o desejo;
  • Um homem ou um macaco agarrando uma fruta em uma árvore representa o apego;
  • Uma mulher grávida representa a existência;
2 ELOS DA VIDA FUTURA:

  • Uma mulher dando à luz representa o nascimento;
  • Uma pessoa carregando um cadáver representa o envelhecimento e morte.
A parte principal da roda é dividida em seis partes, representando os seis reinos da existência cíclica (sânsc. samsara).

Na parte de baixo, estão os três reinos inferiores:
  • seres dos infernos (sânsc. naraka, nairayika);
  • fantasmas famintos (ou espíritos carentes, sânsc. preta);
  • animais (sânsc. tiryak, tiryagyona).

Na parte de cima, estão os três reinos superiores:
  • deuses (sânsc. deva);
  • semideuses (ou deuses invejosos, titãs, sânsc. asura);
  • humanos (sânsc. manushya).

Existem seis reinos onde nós podemos ter renascimento, um deles é o reino humano. Cada reino tem um âmbito de experiência específico, ainda assim podemos vivenciar em corpo humano — embora com muito menos intensidade — as experiências dos seis reinos. Por exemplo, o reino dos infernos é vivido por nós através da experiência de que todas as pessoas que nos cercam são ruins, o filho, o marido, o chefe... Para todo lado que olhamos as coisas são difíceis e só há sofrimento. Através da raiva e da aversão nos conectamos com esse reino. No reino dos seres famintos há uma experiência de carência incessante, eles têm sempre muito pouco diante do que sentem que necessitam. Nos conectamos a essa experiência através da avareza e aquisitividade. Assim como nos infernos, esses seres também não praticam. Os seres nos infernos dizem: "estou sofrendo, tudo é horrível, como eu vou praticar?" Os seres famintos dizem "eu preciso disso e disso, como posso praticar?". Depois há o reino dos animais, eles não praticam porque tão logo eles estejam com suas necessidades satisfeitas, de barriga cheia, dormem. Assim, também não ouvem o Dharma.

Entre os reinos superiores, há os deuses. Não é o reino de Deus, mas dos deuses. No reino humano isso corresponde àqueles que andam de carro importado, jatinho, não tem problemas de dinheiro, desfrutam de todas felicidades do mundo material. Os deuses têm corpos específicos sutis, se deslocam no espaço e produzem benefícios para os seres humanos em dificuldades. O problema é que são benefícios condicionados, e não do tipo que produz liberação. Esse reino é o que os seres humanos buscam em seus sonhos, é a sua perdição... Vivemos almejando chegar lá, trabalhando para isso, ou sonhando com isso. Nos conectamos com esse reino através do orgulho.

Já os semi-deuses têm poder, mas são competitivos e invejosos; passam o tempo todo combatendo. A conexão se dá através da inveja. Os deuses não praticam porque estão imersos em facilidades e felicidades, então, por quê praticar? Os semi-deuses, como estão sempre guerreando, também não têm tempo para praticar.
 (Padma Samten, Prática na Vida Cotidiana)
  
Não é um processo que necessariamente precise ser monitorado. As ações se desenrolam do seu próprio modo, sem que ninguém controle o resultado. Não é como se alguém tivesse que contabilizar tudo para que cada qual fosse parar no reino certo, etc. As ações de cada ser determinam as experiências futuras desse ser. [...]

A idéia de que podemos vivenciar estes reinos de sofrimento que chamamos de infernos deixa muitas pessoas céticas ou enraivecidas. Elas não acreditam em inferno; pensam que este conceito não passa de uma tática que algumas religiões empregam para assustar e controlar as pessoas. Em certo sentido, é verdade que o inferno não existe. Se fizermos uso de toda a tecnologia do mundo para tentar chegar ao centro da Terra, nunca acharemos o inferno. No entanto, muitos seres estão sofrendo no reino dos infernos neste exato momento.

O inferno é o fluxo dos enganos e fantasias da mente, dos pensamentos e interações raivosos, e das palavras e ações nocivas que eles produzem. Se não forem controlados, não há como deixarmos de vivenciar o inferno. [...] Algumas pessoas experimentam o inferno mesmo enquanto contam com um corpo humano. Muitas delas ocupam nossos hospitais. [...] Poderíamos estar sentados no mesmo quarto que elas, e não enxergar nada do que sofrem. Ao mesmo tempo, podemos estar bem ao lado de um grande meditador que vivencia o céu, a terra pura, sem que nós mesmos enxerguemos isso. [...]

Embora grandes meditadores consigam vislumbrar outros reinos, nós não temos prova absoluta sequer de que o nosso mundo fenomênico humano exista além das nossas mentes individuais e coletivas. Ainda assim, da mesma forma que tomamos nossos sonhos como reais enquanto estamos dormindo, consideramos real o nosso reino humano. E os cinco outros reinos são tão reais para os seres que neles existem quanto a nossa experiência é para nós. O inferno parece tão real para um ser no inferno, o reino dos fantasmas famintos tão real para um fantasma faminto, quanto o reino humano para nós. Em última análise, o sofrimento provém não dos fenômenos desses reinos, mas do fato dos seres conferirem realidade a eles. Assim, não é contraditório dizer que nossa experiência é real ou verdadeira, e ao mesmo tempo falsa. Nem é contraditório dizer o mesmo de qualquer outro reino. Se insistirmos que o reino humano é real, então todos os demais reinos são reais, porque os seres que neles existem os experimentam como reais. [...]

Quando tomamos consciência do sofrimento e das limitações da existência cíclica, passamos a ter motivação para encontrar uma saída, da mesma forma que, quando nos damos conta de que estamos doentes, buscamos algum remédio. Ao compreender que a virtude e a não-virtude determinam se a nossa experiência será de felicidade ou tristeza, prazer ou dor, cabe-nos uma escolha: podemos mudar nossas ações e cultivar qualidades virtuosas, buscando a liberação para nós mesmos e para os outros seres, ou podemos continuar a criar não-virtude, perpetuando sofrimento sem fim.
 (Chagdud Tulku Rinpoche, Portões da Prática Budista)
  
No centro da roda há três animais que representam os três venenos (sânsc. klesha) da mente, a origem dos seis reinos e dos doze elos: o desejo (apego) é representado por um galo; o ódio (aversão) é representado por uma serpente; e a ignorância (conhecimento errôneo), a fonte dos outros dois venenos, é representada por um porco ou javali. O galo e a serpente geralmente aparecem saindo da boca do porco, indicando que o apego e a aversão surgem da ignorância. Ao transcendermos estes três venenos, podemos nos libertar do sofrimento dos seis reinos e extinguir os doze elos que nos prendem a ele.

Ao redor do círculo com estes três animais, há dois semicírculos que representam a virtude e a não-virtude. O semicírculo negro representa o karma negativo, que conduz aos reinos inferiores. O semicírculo branco representa o karma positivo, que conduz aos reinos superiores.

Observando a roda da vida, é possível contemplar os quatro pensamentos que transformam a mente: a preciosidade do nascimento humano, a impermanência, o karma e o sofrimento. Esta contemplação é muito eficaz para despertar a compaixão, o amor, a alegria e a equanimidade.

Os humanos têm maior vantagem. As nossas felicidades e sofrimentos não são tão duradouras. E quando cruzamos de uma felicidade para uma infelicidade, buscamos os ensinamentos. Isso é a vida humana comum. Ainda assim ela é muito rara. Se compararmos a nossa vida com outros seres, eles são muito mais numerosos. O corpo humano é raro e improvável. Como nós somos geridos pelo karma, o nosso renascimento é construído pela nossa condição kármica. Nós não conseguimos dirigir esse processo. É como a tartaruga cega, que a cada cem anos vêm à superfície do oceano, de águas revoltas, onde há um aro boiando. O renascimento humano é tão improvável quanto esta tartaruga, justamente no momento em que sobe à superfície, conseguir colocar sua cabeça dentro do aro que estava boiando.

A nossa condição humana hoje é favorável. Os seres humanos têm a possibilidade de praticar. Temos a liberdade de olhar nossos impulsos e perceber aspectos mais sutis. Temos tempo livre. Isso significa méritos. Já a "vida humana preciosa" tem características peculiares que transcendem em muito a vida humana típica. Quando vivemos em épocas em que os seres de luz não se manifestam, nos sentimos perdidos e a vida parece sem sentido. Na época atual os seres de sabedoria vieram; vieram e deram ensinamentos que foram guardados e transmitidos. Esses ensinamentos chegaram até nós e estamos numa região onde esses ensinamentos existem. Além disso, temos sensibilidade para ouvi-los. Dizem que há uma vida humana preciosa quando, além desses fatores, estamos engajados em transformar a nossa vida a partir dos ensinamentos dos seres de sabedoria. Se estivéssemos sob domínio de seres negativos, ou se tivéssemos um modo de ação incorreta, não conseguiríamos ouvir os ensinamentos. Se não estamos sob essas condições, isso completa as características da vida humana preciosa. Se a vida humana é numerosa como as estrelas no céu noturno, a vida humana preciosa é tão rara quanto estrelas que são vistas no céu diurno. A pessoa está engajada em produzir benefícios para todos os seres.

O segundo pensamento é sobre a impermanência. Todas as coisas são impermanentes. Nós estamos sempre buscando o que é estável, mas nos enganamos. Onde estão os meus amigos "inseparáveis" da escola? A gente nem sabe onde eles estão hoje. Onde está a casa da nossa infância? A nossa mãe, pai, irmãos? O primeiro namorado, que foi maravilhoso, mas sumiu. A nossa experiência é de instabilidade e transformação constantes. Se diz no buddhismo que o planeta Terra vai desaparecer. O que dizer então das nossas pequenezas? Estamos aqui por um curto espaço. Esse ensinamento vem para aprendermos a olhar com o olho correto à cada momento. O olho incorreto é pensar que tudo é estável. Quando entendemos a preciosidade da nossa vida, e a usamos para produzir benefícios aos outros seres, este é o sinal de que os ensinamentos produziram as transformações que buscávamos. A seguir, o karma. Estamos sujeitos a impulsos internos com os quais não podemos lidar. Esses impulsos produzem as dez ações não-virtuosas ou as correspondentes dez ações virtuosas. As ações virtuosas vão produzir experiências favoráveis — isso também é karma, karma favorável ou positivo, mérito. São experiências de felicidade condicionada. O karma se manifesta em quatro níveis: imediato, a curto, médio e longo prazo. Por exemplo, se desejamos que alguém morra, naquele exato instante estamos esquecidos da nossa condição búddhica, luminosa, perfeita, e isso já é sofrimento. O de curto alcance, é que de novo e de novo vemos a morte de alguém como solução para nossos problemas. O de médio alcance vai se prolongar por essa vida e por outras: a pessoa não se sente digna, sente-se impura por dentro, inferior, e tem uma marca de aversão pelos outros.

Pior que pensar é planejar como fazer. Aí a perturbação se intensifica. A pessoa vai ter sentimentos mais perturbadores, pode começar a ter pesadelos. Se fez isso e executou, a experiência que é muito intensa, vai haver uma intranqüilidade muito grande. E se o ser morreu, é pior ainda. Ela vai se sentir perseguida. Por um longo tempo vai sofrer. Então temos essas quatro etapas kármicas que acompanham cada ação.

Nós temos uma multiplicidade de possibilidades tanto positivas quanto negativas. Tanto uma quanto outra são condicionadas, podem flutuar, estamos sempre pulando de um ponto para outro. Estamos presos nisso, é automático. Esses impulsos estão a nosso serviço, mas quando eles começam a andar por si, são karma. Temos vários mecanismos condicionados, o nosso cabelo cresce, as unhas crescem, sem que a gente faça alguma coisa. E por causa do karma surge a etapa seguinte, o quarto pensamento, que é o sofrimento. Sempre que operamos com referenciais duais, o sofrimento é inevitável. Aí surge o pensamento final que é: eu gostaria de me liberar disso, revelar minha natureza luminosa, usar de forma positiva as relações que estou vivendo, beneficiar os seres.

Em meio às confusões do mundo e tendências kármicas, toda vitória que podemos ter é como vitória no campo de futebol, frágil, impermanente. Agora mudamos, queremos descobrir a nossa natureza completa. Quando olhamos na vida, a nossa vontade de mudar é testada várias vezes, isso é prática espiritual. Aí nossa paisagem ao redor se transforma de samsara, lugar de sofrimento e enganos, em terra pura, que é onde praticamos, recebemos ensinamentos e nos sentimos protegidos pelos seres de sabedoria.

Os Budas olham o que chamamos de samsara e vêem a perfeição que ali existe. Somos como formigas num palácio, não conseguimos reconhecê-lo com nossos olhos de formiga. Há, então, uma longa etapa de transformação dos nossos olhos, até que possamos reconhecê-lo. Em geral, não conseguimos perceber o valor do benefício real que estamos recebendo. Paralelamente ao processo de transformação das tendências kármicas, o Buda ensinou a prática ininterrupta das "quatro qualidades incomensuráveis", que são o método positivo de manifestação no cotidiano solucionando as confusões e conflitos.

A primeira é a compaixão, o desejo que os seres realizem sua natureza interna e se livrem de suas complicações. Essencialmente é o desejo que o outro supere suas dificuldades e possa melhorar. Atenção: compaixão é diferente de ‘pena’. Quando temos pena, estamos validando a imagem que a pessoa faz de si mesmo, e justamente por isso ela está mal. Compaixão é reconhecer no outro a sua natureza estável, perfeita, de luz, sua condição verdadeira, quebrando o encanto dos jogos que estão produzindo as complicações. A segunda é o amor, o desejo que o outro seja feliz, completamente. Não exclui ex-maridos, ex-esposas, ex-sócios... Depois a alegria, a capacidade de se alegrar com as alegrias e vitórias dos outros, pequenas ou grandes. É um poderoso antídoto contra a inveja. Finalmente a equanimidade: perceber as flutuações das alegrias e tristezas da vida; num momento se tem uma grande alegria, em outro aquilo mesmo vira uma grande tristeza. Surge uma serenidade estável frente a essas flutuações e uma fé permanente, inabalável na natureza de todos os Buddhas, que é a sua própria natureza.

O Buddha ensinou também os meios de produzir felicidade nas relações humanas: casamento, namoro, filhos, trabalho, estudo. Em primeiro lugar, ao invés de pensar ‘o quê vou obter do outro’, pensar ‘o que posso oferecer’. Alegrar-se em oferecer! Se estivermos na dependência do comportamento do outro para obter felicidade, eventualmente pode até funcionar, mas quando surgir a impermanência e o outro flutuar, entramos em crise. S.S. o 14º Dalai Lama, prêmio Nobel da Paz, sempre brinca, ‘que tipo de amor é o de vocês, aquele que só existe se o outro sorrir?’ Esse tipo de amor está baseado em quanto estamos recebendo e, por isso, é frágil. Praticando assim, podemos usar a vida cotidiana como caminho espiritual, superando os conflitos internos e trazendo benefícios a todos os seres. Alegria!
 (Padma Samten, Prática na Vida Cotidiana)

Lembre-se que, nos infernos inferiores, os seres queimam como o sol, e que nos infernos superiores, eles congelam. Lembre-se de como os fantasmas e espíritos sofrem com a fome, a sede e o ambiente. Lembre-se de como os animais sofrem as conseqüências de sua estupidez. Abandone as causas kármicas de tais misérias e cultive as causas da alegria. A vida humana é rara e preciosa; não faça dela uma causa para o sofrimento. Tome cuidado; use-a bem.
(Nagarjuna, citado em Path to Enlightenment)

Adaptado da página: www.dharmanet.com.br