sábado, 30 de outubro de 2010

A Morte como conselheira

A morte é a única coisa que modera os nossos espíritos.
Por mais que fujamos do assunto, a morte é um tema central das tradições autênticas do trabalho interior, como a dos videntes toltecas do Antigo México a exemplo das outras tradições antigas genuínas como o budismo, cristianismo, islamismo, hinduismo, o judaísmo, o taoísmo, a egípcia, etc..
Aparentemente diferentes na forma exterior e ritos, para o observador atento, todas essas tradições revelam porém um eixo comum de pressupostos, conceitos e portanto da própria essência de que ele é formado. A idéia da morte sempre está presente no eixo do conceito das tradições de busca interior.
Qual será a razão? Porque uma idéia tão negativa, desconfortante e desafiadora para nós, é acatada por todas as tradições como tão importante? Mesmo a tradição cristã tinha um ritual chamado A Boa Morte, simulando concretamente o bardo da passagem de um estado para outro, como faz a Maçonaria e outras tradições, mas logo se apressaram a excluí-lo das práticas cristãs nas igrejas. É muito mais confortável violão na Missa. Muito mais maneiro, mais políticamente correto. Morte está fora de moda...
Uma perda, meus caros. Uma perda...
A visão tolteca da morte apresentada por Don Juan na obra de Castaneda, porém, dá indícios dessa importância e acrescenta pontos inesperados de compreensão a partir da nossa mente habitual.
Como aprendizes desta tradição, somos desafiados a não só encará-la de frente sem medos nem escapes mas, o que é mais desconcertante, devemos nos aproximar da Morte como uma amiga e conselheira!
Para um ocidental, que desconhece a impermanência das coisas, criado numa paisagem que valoriza o sucesso, a propriedade, o ter ao invés de ser, a idéia é inaceitável. É a antítese da vida. O avesso do avesso como diz o Caetano.  O ocidental, porém, não percebe que esses valores comuns e corriqueiros reforçam a idéia de que eu sou imortal, de que a morte é sempre a dos outros e não a minha. No máximo ela me incomoda mais de perto quando leva um amigo, um parente próximo, mas em seguida estamos refeitos. Basta umas boas férias. E como "imortais que somos", nunca estamos preparados para o espetáculo da nossa morte individual, específica, pessoal como no Bardo Thodol, o livro da morte tibetano. Porque "imortal não tem que se preparar para nada, ora"...  Nem aprendemos o que fazer nessa hora da passagem. Muito menos durante e depois.
Para o aprendiz tolteca, rompida essa barreira pela aproximação voluntária com a morte, somos instigados depois a usá-la consistente e disciplinadamente como instrumento crucial de despojamento rotineiro do ego e de desapego dos valores socialmente aprendidos. Só então poderemos abrir uma brecha na nossa estrutura cristalizada de hábitos, história pessoal e auto-importância de seres comuns. Isso é essencial para o aprendizado da liberdade.
É um desafio monumental.
Os 12 livros que compõem a obra de Castaneda, mais os três outros dos seus seguidores definem os contornos do conceito da morte na visão tolteca e fornecem visões sugestivas, contam fatos e feitos dos guerreiros, e nos jogam no meio de uma fogueira de idéias inesperadas e instigantes.
Castaneda disse uma vez a através de Armando Torres, índio descendente dos toltecas, bruxo e escritor, que a árvore da qual será construído o nosso caixão, provavelmente já foi cortada...já pensou nisso?
Don Juan dizia a Castaneda que não há poder que garanta que você vai viver mais um minuto. E que a sua morte individual está do seu lado esquerdo à distância de um braço. Aprenda a conversar com ela. Peça conselhos nas horas difíceis.
Na melhor das hipóteses, temos pouco tempo...então o que fazemos?

10 comentários:

  1. Nooosssa a tradição cristã tinha um ritual chamado A Boa Morte, simulando concretamente o bardo da passagem de um estado para outro, e foi excluída.
    Caramba, perda mesmo. Imagina que beleza seria se ainda tivesse. Eu teria adorado isso na minha adolescência. Com certeza teria me dado uma profundidade de viver. Pois nessa época eu questionava as freiras e os padres sobre tudo o que ouvia ou lia relacionado à religião, e eles desconversavam.
    Luara

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  2. Pois é, eu tive a oportunidade de participar disso, num internato Salesiano, na minha adolescência. Tenho o roteiro, que consegui com um amigo.
    Abraço

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  3. P/ o Luis Arnaldo ou Preto?,

    Gostei muito do seu blog!
    Abaixo, uma postagem p/ rir ou pensar.
    bjss
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    Dona Morte

    Ontem à noite eu a ví.
    Sempre dizia " não tenho mêdo de morrer"
    Mas ontem, eu senti.

    Ela surgiu no meu quarto e ficou num canto.
    Me aterrorizando.
    Era feia e fria, muito velha, muito vazia.

    Tinha uma foice na mão direita e a mão esquerda caída...

    Era a tal da Dona Morte!

    Imagens e sensações invadiram todo o espaço.
    Não sei por quanto tempo permaneci neste estado.
    Quieta e encurralada.
    Num pesadelo acordada.

    A qual saída me lançar?
    Percorria caminhos imaginários,
    Testando todos os lados...
    Mas saída não havia!

    Qualquer caminho.
    Qualquer movimento que fizesse.
    Ela me esperava.
    E ela não vinha,
    Era muito pior.
    Me aguardava!

    Com a foice na mão direita
    e a mão esquerda caída...

    Arrisquei um " vá embora!"
    E ela ficou lá, num canto à me espreitar.
    Tentei chamar amigos por telepatia.
    Mas ela abortava qualquer tentativa.

    Eu estava só,
    entre imagens e pensamentos.
    Frio e suor.

    Rezar?
    Era tudo que ela esperava.
    Para, igual assombração,
    Avançar!

    E,
    quando mais nada me vinha,
    quando mais nada eu tinha,
    O nada encontrei.

    O Nada aceitei.

    Nenhum pensamento.
    Nenhum argumento.
    Nenhuma forma nem cor.
    Nenhum frio mais...nem calor.

    Me resgatei!
    H.Hinza

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  4. oi Anônimo
    Gostei da poesia. Quem é o H. Hinza?
    Abraço

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  5. "Qual será a razão? Porque uma idéia tão negativa, desconfortante e desafiadora para nós, é acatada por todas as tradições como tão importante?"

    É simples: é porque a morte é a única coisa que temos. Todo o resto nos pode ser tirado, a morte não. É individual e intransferível...

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  6. Oi Joãj (é assim mesmo que se escreve?)
    Na mosca! Tá com um jeitão de Don Juan...
    Abraço

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  7. joãoj ou JoãoJ
    palíndromo, né... abç

    (pode deletar essa)

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  8. Acertou na mosca!
    Tá tão evidente assim?

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  9. Preto,
    é a H.Hinza, não o.
    Poesias na madrugada, que de dia é só trabalho.
    "A noite inspira todos os perfumes sentidos do dia."
    Bjs

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