“Eu penso” é uma afirmação simplesmente tão falsa quanto “eu faço a digestão” ou “eu faço meu sangue circular”. A digestão acontece, a circulação acontece, o pensamento acontece.
A voz na nossa cabeça tem vida própria. A maioria de nós está à mercê dela; as pessoas vivem possuídas pelo pensamento, pela mente. E, uma vez que a mente é condicionada pelo passado, então somos forçados a reinterpretá-lo sem parar. O termo oriental para isso é carma.
O ego não é apenas a mente não observada, a voz na cabeça que finge ser nós, mas também as emoções não observadas que constituem as reações do corpo ao que essa voz diz.
A voz na cabeça conta ao corpo uma história em que ele acredita e à qual reage. Essas reações são as emoções.
A voz do ego perturba continuamente o estado natural de bem-estar do ser. Quase todo corpo humano se encontra sob grande tensão e estresse, mas não porque esteja sendo ameaçado por algum fator externo - a ameaça vem da mente.
O que é uma emoção negativa? É aquela que é tóxica para o corpo e interfere no seu equilíbrio e funcionamento harmonioso.
Medo, ansiedade, raiva, ressentimento, tristeza, rancor ou desgosto intenso, ciúme, inveja - tudo isso perturba o fluxo da energia pelo corpo, afeta o coração, o sistema imunológico, a digestão, a produção de hormônios, e assim por diante. Até mesmo a medicina com, que ainda sabe muito pouco sobre como o ego funciona, está começando a reconhecer a ligação entre os estados emocionais negativos e as doenças físicas. Uma emoção que prejudica nosso corpo também contamina as pessoas com quem temos contato e, indiretamente, por um processo de reação em cadeia, um incontável número de indivíduos com quem nunca nos encontramos. Existe um termo genérico para todas as emoções negativas: INFELICIDADE.
Por causa da tendência humana de perpetuar emoções antigas, quase todo mundo carrega no seu campo energético um acúmulo de antigas dores emocionais, que chamamos de “corpo de dor”.
O “corpo de dor” não consegue digerir um pensamento feliz. Ele só tem capacidade para consumir os pensamentos negativos porque apenas esses são compatíveis com seu próprio campo de energia.
Não é que sejamos incapazes de deter o turbilhão de pensamentos negativos - o mais provável é que nos falte vontade de interromper seu curso. Isso acontece porque, nesse ponto, o “corpo de dor” está vivendo por nosso intermédio, fingindo ser nós. E, para ele, a dor é prazer. Ele devora ansiosamente todos os pensamentos negativos.
Nos relacionamentos íntimos, os “corpos de dor” costumam ser espertos o bastante para permanecer discretos até que as duas pessoas comecem a viver juntas e, de preferência, assinem um contrato comprometendo-se a ficar unidas pelo resto da vida.
Nós não nos casamos apenas com uma mulher ou com um homem, também nos casamos com o “corpo de dor” dessa pessoa.
Pode ser um verdadeiro choque quando - talvez não muito tempo depois de começarmos a viver sob o mesmo teto ou após a lua-de-mel - vemos que nosso parceiro ou nossa parceira está exibindo uma personalidade totalmente diferente. Sua voz se torna mais áspera ou aguda quando nos acusa, nos culpa ou grita conosco, em geral por uma questão de menor importância.
A essa altura, podemos nos perguntar se essa é a verdadeira face daquela pessoa - a que nunca tínhamos visto antes- e se cometemos um grande erro quando a escolhemos como companheira. Na realidade, essa não é sua face genuína, apenas o “corpo de dor” que assumiu temporariamente o controle.
Seria difícil encontrar um parceiro ou uma parceira que não carregasse um “corpo de dor”, no entanto seria sensato escolher alguém que não tivesse um “corpo de dor” tão denso. O começo da nossa libertação do “corpo de dor” está primeiramente na compreensão de que nós o temos.
É nossa presença consciente que rompe a identificação com o “corpo de dor”. Quando não nos identificamos mais com ele, o “corpo de dor” torna-se incapaz de controlar nossos pensamentos e, assim, não consegue se renovar, pois deixa de se alimentar deles. Na maioria dos casos, ele não se dissipa imediatamente.
No entanto, assim que desfazemos sua ligação com nosso pensamento, ele começa a perder energia.
A energia que estava presa no “corpo de dor” muda sua freqüência vibracional e é convertida em “presença”.
Uma pergunta que as pessoas costumam fazer é:
"De quanto tempo precisamos para nos libertar do corpo de dor?".
Evidentemente, isso depende tanto da densidade do corpo de dor quanto do grau, ou da intensidade, da presença manifestada em cada um de nós.
No entanto, não é o corpo de dor, e sim a identificação com ele que causa o sofrimento que infligimos a nós mesmos e aos outros. É essa identificação que nos leva a reviver o passado vezes sem conta e nos mantém no estado de inconsciência.
Assim, uma pergunta mais importante a se fazer seria esta:
"De quanto tempo necessitamos para nos libertar da identificação com o corpo de dor?"
A resposta a esta pergunta é: não demora tempo nenhum.
Sempre que o corpo de dor estiver em atividade, temos que estar cientes de que o que estamos sentindo é o corpo de dor em nós. Esse conhecimento é tudo de que precisamos para interromper a identificação com ele. E, quando essa identificação cessa, a transmutação tem inicio.
O conhecimento impede que as emoções antigas surjam na nossa cabeça e controlem não só o diálogo interior como também nossas ações e interações com as pessoas. Assim, o corpo de dor não conseguirá mais nos usar e se renovar por nosso intermédio.
As antigas emoções podem ainda viver em nós por algum tempo e aparecer de vez em quando. Talvez também nos enganem ocasionalmente, fazendo com que nos identifiquemos com elas de novo e, desse modo, obscureçam o conhecimento, porém não por muito tempo.
Não projetarmos as antigas emoções nas situações significa que devemos encará-las diretamente dentro de nós. Pode não ser agradável, mas isso não chega a nos matar. Nossa presença (*) é mais do que capaz de conte-las. As emoções NÃO são quem nós SOMOS.
(*) Nota - "estar presente": estar no agora, consciente, centrado, focado, ser o observador.
Portanto, quando sentir o corpo de dor, não comece o equivoco de pensar que existe algo errado com você. O ego adora quando você faz de si mesmo um problema.
O conhecimento precisa ser seguido pela aceitação.
Qualquer outra coisa, irá obscurecê-lo novamente.
Aceitação significa que você se permite sentir qualquer coisa naquele momento. Isso é parte da essência do Agora. Você não pode discutir com “o que é”. Bem, você pode. No entanto, se fizer isso, sofrerá.
Por meio da aceitação, você se torna o que você é: vasto, pleno de espaço. Transforma-se no todo. Não é mais um fragmento, que é como o ego vê a si mesmo. Sua natureza verdadeira emerge, e ela está unificada com a natureza de Deus.
Jesus indica isso nesta passagem: "Portanto, sede um todo. Assim como vosso Pai celeste é um todo". (Mateus 5:48)
No Novo Testamento temos, porem "sede perfeitos", o que é um erro de tradução da palavra grega original, que significa "todo".
Ou seja, não precisamos nos tornar um todo, mas sermos o que já somos - com ou sem o corpo de dor.
Do livro O Despertar de Uma Nova Consciência - Eckhart Tolle
Nenhum comentário:
Postar um comentário