sábado, 21 de março de 2015

Por que os Budistas Rezam?

Elizabeth-Mattis Namgyel, mestra budista americana
Na postagem Meditar? Orar? Para que? falamos da Conexão entre essas duas coisas, meditar e orar. Hoje apresentamos uma visão budista da razão de orar, rezar. Curiosamente o budismo é uma "religião sem Deus". Só há Buda, um ser que se iluminou depois de muitas vidas, e então tomou contato com a fonte de onde emana tudo, as causas, os universos. Na verdade a oração nos auxilia no caminho dessa "barra pesada" que é viver, usando-a para despertar ao invés de vez de lutar contra ela. Vamos lá:

Quando reconhecemos o quanto ficamos perdidos no ímpeto habitual de nossos pensamentos e emoções, percebemos como temos pouca força para nos mover em direção à sanidade. Isso pode nos inspirar a compreender e apreciar a força da oração. A oração corta a atividade selvagem e discursiva da mente, nos direcionando e provendo meios para aproximar nossas ações das nossas intenções.

Porque o budismo é uma religião não-teísta, temos a tendência de descartar a oração como sendo dualista. Afinal, ao colocar a responsabilidade pelo nosso desenvolvimento espiritual em algo fora de nós, não estamos tentando fugir? Para quem estamos rezando? Nesse momento e nessa era,  geralmente a oração é vista como superstição e com embaraço. Esquecemo-nos que funcionamos com a mente dual na maior parte do tempo e que há benefícios em saber o que queremos e saber pedir por isso no caminho espiritual.

Temos que pensar com praticidade sobre a espiritualidade. Simplesmente esperar que um dia nós iremos acordar “totalmente iluminados” não fará o trabalho por nós. Sem uma intenção definida, caímos na imprecisão e operamos através da falta de clareza. Devemos nos perguntar, onde estamos indo? O que realmente queremos? A oração é como andar de bicicleta: nossa direção sempre vai naturalmente seguir nosso olhar. Como o Buda disse nos sutras: “Você é seu próprio mestre. Você faz seu próprio futuro; não há outro refugio”. A direção que seguimos é por nossa conta. Se direcionarmos nossa mente na direção de ganhar dinheiro, tem maior chance de isso acontecer. Se não, é questionável que seremos capazes de pagar o aluguel. O mesmo é verdade com a nossa vida espiritual. O progresso espiritual – progresso humano – requer uma intenção clara.”

Pedir

Nós suplicamos porque, na vida, geralmente não sabemos o que fazer. Rezar pode ser um jeito de nos entregar para o mistério e o movimento da vida. Expressa uma aceitação de que não sabemos nada e nunca saberemos – que apenas enxergamos uma pequena parcela das coisas. Não enxergamos a teia infinita do relacionamento interconectado do qual fazemos parte. Ainda assim, por outro lado, temos nosso papel para desempenhar no todo, e tudo o que fazemos na vida é importante. Esse é um paradoxo interessante, não é? É preciso uma mente ampla para viver no coração desse paradoxo – estar alerta e receptivo, e ao mesmo tempo, aceitar a natureza indeterminada das coisas, os fatos que não sabemos. Esse é o espírito da oração.

Podemos rezar por qualquer coisa. Mas para o que rezamos influencia na direção em que vamos e na natureza transformativa da prática. Rezar para a felicidade e para nos livrar do sofrimento nos mantém dentro dos limites da mente comum. As orações não têm a mesma agudeza e liberação quando estamos tentando evitar a vida e deixar de sentir o mundo em nossa volta. Se nos distanciamos do nosso desejo individual de sermos livres do sofrimento dentro do todo, onde reconhecemos que o sofrimento é parte da vida nesse corpo e nesse mundo, temos a experiência da profundidade da oração. Aceitar a beleza e a dor do nosso mundo é a fundação do caminho do Buda.

Então o que significa rezar sem as limitações de nossas preferências individuais? Significa que estamos rezando para um despertar profundo e incondicional não baseado nas preferências do ego. Só em pedir nós experienciamos uma mente poderosa e humilde. Permitimos que a vida nos toque, e sentimos o desejo de seguir em frente com compaixão e amor.

Como praticar a oração?

Duas vezes por ano, minha comunidade se reúne para um retiro em grupo – drupcho – onde recitamos cem mil preces de renomados mestres de meditação de nossa linhagem, Kunchyen Jigme Lingpa. Porque essa é uma prática em grupo, e nós recitamos a prece em voz alta, várias e várias vezes, há uma grande demanda de energia, foco, criatividade, e visão. Quando não prestamos atenção e nos esquecemos de fazer nossa prece de forma pessoal, nossa prática se torna vaga e apenas um hábito, e a energia na sala diminui.

Com a oração, sempre existem os altos e baixos. A prática demanda força e insistência. Quando a mente habitual quer se fechar, a oração serve como uma negação teimosa em cair no mundo cansativo e familiar do ego. Em outras horas, a mente flui sem esforço. Quando isso acontece em um grupo, toda a atmosfera volta à vida e o poder a oração é palpável e forte.

Então, como rezamos? Você pode recitar uma prece em particular ou rezar de modo espontâneo, usando suas próprias palavras. Apesar de tudo, é importante tornar nossa oração pessoal. As pessoas geralmente comentam que ajuda fazer a suplicação de forma específica para que a prática não se torne abstrata. Você pode começar focando em um amigo que está sofrendo de alguma doença ou num animal maltratado. Ou você pode suplicar para uma forma de sair de um hábito prejudicial ou vício. Às vezes, a oração naturalmente vai se desenvolver para um descanso, além de palavras e ideias, dentro da natureza insondável do ser.

Nos retiros em grupos falamos para as pessoas mandarem pedidos de oração. Elas as enviam via e-mail e uma vez por dia nós as lemos em voz alta. Todo mundo escuta com tanta atenção enquanto suas orações estão sendo lidas que você poderia escutar um alfinete caindo. Algumas das orações são bem generalistas: para o bem-estar dos animais, para os idosos, crianças em situações abusivas, soldados lutando em guerras, pessoas vivendo em prisões, ou sofrendo de depressão. Algumas vezes, os pedidos de oração incluem nomes e descrições de situações pessoais.

Sempre me surpreende quantos pedidos de oração nós recebemos, os quão pessoais eles são e quanta coragem as pessoas têm, em pedir. Quando escutamos os pedidos, sentimos a presença de todas aquelas pessoas como se elas estivessem sentadas reunidas conosco. Suas orações nos emocionam e catalisam a nossa prática, gerando uma atmosfera geral de cura e positividade, que fala do poder da interdependência. Às vezes, eles nos escrevem de volta, dizendo como se sentiram tocados e como isso fez diferença para eles e suas pessoas queridas.

Imaginação

Quando rezamos, pode ser para uma imagem do Buda ou de nosso professor. Ou você pode rezar para a natureza de sua própria mente, como sendo inseparável da natureza da deidade. Às vezes você pode até não saber a quem direcionar suas orações, mas o pedido por si só tem seu próprio poder. De fato, se você pensar sobre isso, você realmente tem que saber de tudo? Você tem a capacidade de saber? A natureza do Buda, do professor, ou de qualquer coisa no mundo é insondável, misteriosa, e não se presta a ser conhecida de uma forma conclusiva.

E é particularmente importante refletir sobre isso, porque no mundo moderno, rezar para um objeto pode parecer artificial. Podemos até querer acreditar em uma deidade ou no Buda, mas parece afetado. Um dos aspectos mais importantes e únicos dessa tradição é a compreensão de que nada possui uma existência intrínseca. Muitas vezes presumimos que nós – quem somos realmente – estamos rezamos para uma deidade imaginária. Mas na verdade, mesmo o que chamamos de “eu” surge de um complexo infinito de relacionamentos que ficam surgindo e caindo a cada momento. Tudo é imaginário, e nisso há a resistência à definição, tudo é dinâmico e aberto à interpretação – ou, em termos budistas, tudo é vazio.

A oração é um meio que nos ajuda a seguir em frente com alguma sanidade – uma prática que nos ajuda a utilizar o mundo para despertar. Podemos rezar para nosso professor ou para o Buda como uma maneira de seguir em frente no nosso caminho. Não temos necessariamente que ver esse dualismo como um problema. Na verdade, enxergar o dualismo como um problema é dualista. O que chamamos de caminho é uma forma de navegar pelo dualismo utilizando positivamente nossa vida e experiências.

Texto escrito por Elizabeth-Mattis Namgyel, originalmente publicado na revista Buddhadharma Magazine edição de outono de 2014 e reproduzido no site da autora. Tradução de Rafaela Batista. Elizabeth Namgyel é uma das muitas mestras budistas norte-americanas contemporâneas (leia “A Face Feminina de Buda”), estuda e pratica o budismo por 30 anos sob a orientação de seu professor e marido, Dzigar Köngtrul Rinpoche.

sábado, 7 de março de 2015

Os Essênios, Cura, Paz, Felicidade

Sempre fui fascinado pelos essênios. Eles são uma dissidência do judaísmo por discordâncias de crença e se situam cronologicamente antes e durante a vida de Jesus, que era considerado também essênio, pois acredita-se que durante a fase misteriosa de seu desaparecimento entre os 12 e os 30 anos ele estivesse entre eles.
A grande contribuição moderna para o conhecimento deste grupo foi feita quando do descobrimento dos Manuscritos do Mar Morto encontrados numa caverna do deserto onde evangelhos antigos, alguns apócrifos, lançaram luzes sobre aqueles tempos e inclusive sobre o Cristianismo, apesar de não terem sido escolhidos como evangelhos “oficiais” pelo concilio de bispos da Igreja, que só escolheu 4 deles entre todos os conhecidos na época: os de João, Lucas, Marcos e Mateus. 
A origem dos Essênios é pouco definida, até mesmo de seu nome é duvidoso. Alguns relacionam seu nome ao profeta Enoch e o consideram o antecessor dos essênios. Segundo outros, o nome essênio significava médico, terapeuta, e se origina da palavra Ezrael. Eles seriam os escolhidos, que Moisés levou à frente de Deus, antes de subir no monte Sinai, para receber os mandamentos de Deus, através de Moisés, a seu povo. Se a própria origem deste nome leva a tantas descobertas, é bem possível que a comunidade já existia desde tempos mais remotos, com diversos nomes.
 Conta-se que em todas cidades eles tinham casas, através de toda a  Palestina. Nestas casas ou pousadas, eles eram acolhidos em suas peregrinações, ganhando toda assistência e alimentação. O historiador  Plinius lembra também de uma comunidade dos essênios que viviam as margens do Mar Morto, que era a comunidade de Qumram, mas também havia os essênios que viviam na Síria e no Egito. Os irmãos do Egito eram chamados de Terapeutas, os curadores. Segundo Edgar Cayce, famoso vidente, Maria, José, João Batista e o próprio Jesus eram essênios.Edgar Cayce, o grande vidente americano, descreveu precisamente onde e como viviam os essênios, que eles estavam espalhados pela Palestina e que o messias viria da comunidade deles. Isto tudo aconteceu onze anos antes de serem descobertos os manuscritos do Mar Morto.
Um dos evangelhos importantes, O Evangelho Essênio, atribuído a São João, está entre eles. É uma jóia inestimável para a saúde física, emocional e mental e deveria ser lido por todos os médicos modernos,  juntamente com o Juramento a Hipócrates, do qual eles se esquecem logo após a cerimônia de formatura.  
Sobre este evangelho, Edmond Bordeaux Szekely, filólogo e filósofo, Phd na Universidade de Paris, escreveu o livro O Evangelho Essênio da Paz baseado no documento original. Na leitura deste evangelho o observador interessado em medicina, saúde e cura vai ficar encantado com a simplicidade do ensinamento. 
Há um lembrete porém: não se esquecer de que a linguagem do texto é fortemente religiosa, um produto da época, e frequentemente repetitiva e maniqueísta. Não devemos nos deixar levar por isso, sob o risco de perder a verdade por trás do texto, que é o grande presente dele.
Há indicações claras sobre a alimentação tanto do físico quanto do emocional e do espírito: o que comer e beber, o quanto comer, como comer, situações a evitar enquanto se come. Além da alimentação do físico há indicações preciosas de como conviver, baseadas nos 10 mandamentos, que lembram os conhecimentos compassivos do budismo. 
Segundo os essênios, há 6 "anjos" ligados à Mãe Terra, e 6 ligados ao Pai Celeste numa clara alusão de que o Homem deve conciliar dentro de si as energias que recebe da terra e do céu, para obter a saúde. O texto diz: 
"Deus não escreveu as leis nas páginas dos livros, senão em vosso coração e em vosso espírito. Encontram-se em vossa respiração, em vosso sangue, em vossos ossos, em vossa carne, em vossos intestinos, em vossos olhos, em vossos ouvidos e em cada pequena parte de vosso corpo.
Estão presentes no ar, na água, na terra, nas plantas, nos raios do sol, nas profundidades e
nas alturas. Todas vos falam para que entendais a língua e a vontade do Deus Vivo.
Porém vós cerrais vossos olhos para não ver, e tapais vossos ouvidos para não ouvir. Em verdade vos digo que a escritura é a obra do homem, porém a Vida e todas as suas hostes são obra de nosso Deus. Por que não escutais as palavras que estão escritas em Suas obras? E por que estudais as escrituras mortas, que são a obra das mãos do homem?”

 E há também a alusão constante da cura através dos 4 elementos, ar, água, fogo e terra. 
É um evangelho da saúde. Enfim, um achado.
Clique aqui:  O EVANGELHO ESSÊNIO DA PAZ para acessar o texto.
Boa leitura!