domingo, 18 de novembro de 2012

A Realidade e o Fantástico

Cada vez mais pessoas estão se tocando com os tempos curiosos em que estamos vivendo. Há uma sutileza no ar mostrando que nossas certezas estão se esvaindo a partir do que a realidade gradualmente nos mostra. Uma realidade impessoal que não afaga as nossas crenças, posições e dogmas, e não dá tréguas ao nosso jeitão enviesado, simplista e preconceituoso de ver o mundo. A razão disso tudo é que há um pensar inadequado sobre o que se apresenta à nossa percepção.
A chamada ciência européia, que em 1815 dizia que “nada no mundo tem a velocidade maior que a de um cavalo”, já em 1850 teve que aceitar a velocidade da luz. Einstein então definiu a velocidade da luz como um limite universal, mas há uns tempos atrás o CERN, organização européia para a pesquisa nuclear afirmou que experiências feitas com neutrinos (sub partículas) indicam que essas partículas desobedientes superaram esse limite. Quer saber o que mais os novos cientistas estão dizendo? Que isso permitiria enviar mensagens e informações para o passado. Pode isso?  Na verdade os estudiosos já  perceberam que logo após o Big Bang, a velocidade de expansão do Universo já teria sido maior que a da luz. Me perdoe o Einstein, mas ele errou? Enfim, um imbroglio. O universo está brincando com a gente, pô!
Para aumentar a insegurança intelectual, fruto desse “pensar linear” ocidental, surgiram atualmente mais contradições ainda. A velocidade de expansão do universo não está obedecendo ao combinado, devido a uma tal matéria escura que apareceu sem avisar, que além de ser absurdamente estranha e não detectável pela ciência, a não ser pelos efeitos que causa, é além de tudo irmã da energia escura, mais estranha ainda. É só estranheza. Antes não era assim...
É a chamada sinuca de bico. Já não bastasse o eletro-magnetismo e a gravidade que os físicos e outros cientistas só conseguem quantificar e aproveitar mas  nunca entenderam direito, a Física quântica, com seus spin e números quânticos de estranheza, tem o desplante de afirmar (e de provar, o que é pior) que “um elétron passa por dois lugares diferentes ao mesmo tempo”. Isso já é demais! Estava certa a Igreja de mandar para a fogueira quem dizia que a terra não era o centro do universo. Aboliram isso. Estão vendo no que deu?
A verdade é que a realidade não dá a menor bola para a ciência, e esta tem que ponderar o que está errado com ela, ciência. Já que pensar é de graça, vamos meter a nossa colher nesse angú e dar a nossa opinião: Seria a nossa concepção do mundo e a forma de pensar que está errada? Será que antes de conceituar a priori essa coisa chamada Realidade, devemos é permitir que ela atinja diretamente os nossos sentidos sem tentar agarrá-la com os conceitos e filtros prévios para que ela então se mostre na sua inteireza? Não é fàcil para um cientista, mas qualquer buscador de uma tradição autêntica sabe como fazer isso. O ser humano em todas as suas atividades, talvez por não se deter sobre a natureza dessa sua aberração mental chamada ego, começa já formando uma opinião sobre um fato, e depois inicia o processo de juntar as informações sobre o fato, somente para filtrar intelectualmente quais as informações provam a veracidade da opinião prévia que já tinha formado. Não é muito diferente da inteligência que orientou a Inquisição. Só é mais sofisticada, já que o intelecto é uma prostituta que se vende a qualquer patrão. Vimos isso todo o tempo na história da humanidade inteira.
Mas o preconceito científico assentado no ego arrogante e dogmático dos homens de ciência é somente um dos problemas, e talvez o menor. Há também o pano de fundo da árida visão cartesiana atual do mundo, orientada por uma lógica ultrapassada, fixa e mutuamente exclusiva do “ou é isso, ou aquilo” onde não há espaço para uma abordagem “é isso e aquilo”, a exemplo da tradição budista, xamânica e outras, sem fronteiras definidas, onde coisas se transmutam em outras sem pedir licença à ciência. Essa seria a abordagem correta do pensar, onde a própria Ciência tem ligação com A Consciência.
A matéria está cada vez mais mostrando que há segredos mais fantásticos que a imaginação mais tresloucada dos contos de ficção científica possa conceber, e esse pensar é que de forma crescente está batendo impaciente às porta da ciência moderna com nomes bizarros: singularidade, buracos negros e brancos, horizonte de eventos, anti-matéria, dobras espaciais, buracos de minhoca, mundos paralelos, e por aí afora.
Há mais de cinquenta anos, em 1960, um livro corajoso começou a reintroduzir o insólito na nossa paisagem intelectual, batizando-o de Realismo Fantástico, e acenando com uma outra forma de pensar e encarar o mundo, mais para a abordagem Zen do que para o dogmatismo da Academia. Ele acenava que a realidade é muito mais fantástica que a fantasia, e previu o que estamos vendo acontecer nas ciências. Vamos a ele: 

"Repito: O Fantástico, a nossos olhos, não é o imaginário. Mas uma imaginação poderosamente aplicada ao estudo da realidade descobre que é muito tênue a fronteira entre o maravilhoso e o positivo, ou, se preferem, entre o universo visível e o universo invisível. Existe talvez um ou vários universos paralelos ao nosso. Creio que não teríamos empreendido esta tarefa se, no decorrer da nossa vida, não tivesse acontecido sentirmo-nos, realmente, fisicamente em contato com outro mundo. 
O antropólogo americano Loren Eiseley, cuja forma de pensar se aproxima da nossa, conta uma bela história que exprime bem o que pretendo dizer. 
"Descobrir outro mundo, diz ele, não é apenas um fato imaginário. Pode acontecer aos homens. Aos animais também. 
Por vezes, as fronteiras resvalam ou interpenetram-se : basta estar presente nesse momento. Vi o fato acontecer a um corvo. 
Esse corvo é meu vizinho: nunca lhe fiz mal algum, mas ele tem o cuidado de se conservar no cimo das árvores, de voar alto e de evitar a humanidade. O seu mundo principia onde a minha vista acaba. Ora, uma manhã, os nossos campos estavam mergulhados num nevoeiro extraordinariamente espesso, e eu me dirigia às apalpadelas para a estação. Bruscamente, à altura dos meus olhos, surgiram duas asas negras, imensas, precedidas por um bico gigantesco, e tudo isso passou como um raio, soltando um grito de terror tal que eu faço votos para que nunca mais ouça coisa semelhante. Esse grito perseguiu-me durante toda a tarde. Cheguei a consultar o espelho, perguntando a mim próprio o que teria eu de tão revoltante ... 
Acabei por perceber. A fronteira entre os nossos dois mundos resvalara, devido ao nevoeiro. Aquele corvo, que supunha voar à altitude habitual, vira de súbito um espetáculo espantoso, contrário, para ele, às leis da natureza. Vira um homem caminhar no espaço, bem no centro do mundo dos corvos. Deparara com a manifestação de estranheza mais completa que um corvo pode conceber; um homem voador ... 
Agora, quando me vê, lá do alto, solta pequenos gritos, e reconheço nesses gritos a incerteza de um espírito cujo universo foi abalado. Já não é, nunca mais será como os outros corvos ..."

Esse livro não é um romance, embora a intenção seja romanesca. Não faz parte da ficção científica, embora nele se deparem mitos ,que sustentam esse gênero. Não é um conjunto de fatos estranhos, embora o Anjo do Bizarro nele se sinta à vontade. Também não é uma contribuição científica, o veículo de um ensino desconhecido, um testemunho, um documentário, ou uma efabulação. É a narrativa, por vezes romanceada e por vezes exata de uma primeira viagem pelos domínios do conhecimento ainda quase por explorar. Como nos diários de bordo dos navegadores do Renascimento, o imaginário e o real, a extrapolação audaciosa e a visão exata confundem-se. É que não tivemos nem o tempo nem os meios de aprofundar completamente a exploração. Podemos apenas sugerir hipóteses e indicar as vias de comunicação entre esses diversos domínios que ainda são, por agora, terrenos proibidos. Sobre esses terrenos proibidos apenas fizemos pequenas paradas. Quando tiverem sido mais bem explorados, sem dúvida se verificará que muitas das nossas suposições eram delirantes, como os relatos de Marco Polo. É uma eventualidade que aceitamos calmamente. "Havia uma quantidade de disparates no livro". Eis o que dirão. Mas se este livro provocar a curiosidade de aprofundar o assunto, o nosso fim terá sido atingido. 
Onde estamos nós atualmente? Abriram-se portas em quase todos os edifícios científicos, mas o edifício da física de hoje em diante quase que não tem paredes: é uma catedral cheia de vitrais onde se refletem os clarões de outro mundo, infinitamente próximo. 
A matéria revelou-se tão rica, se não mais rica em possibilidades do que o espírito. Ela contém uma energia incalculável é suscetível de transformações infinitas, tem recursos insuspeitáveis, O termo "materialista", na acepção que lhe dava o século XIX, perdeu todo o sentido, da mesma forma que o termo "racionalista". 
A lógica do "bom senso" já não existe. Na física atual, uma proposição pode ser simultaneamente verdadeira e falsa. A X B já não é igual a B X A. Uma mesma entidade pode ser ao mesmo tempo contínua e descontínua. Já não nos poderíamos referir à física para condenar tal ou tal aspecto do possível 
Nota: Um dos sinais mais espantosos da abertura que se produz no domínio da física é a introdução daquilo que se chama "o número quântico de estranheza". Eis, por alto, de que se trata. No princípio do século XIX, pensava-se ingenuamente que dois números, no máximo três, seriam suficientes para definir uma partícula de matéria. Esse número seria a sua massa, a sua carga elétrica e o seu momento magnético. A verdade estava longe de ser tão simples. Para descrever completamente uma partícula foi necessário acrescentar uma grandeza intraduzível em palavras e que se chamava "spin". A princípio, julgou-se que essa grandeza correspondia a um período da rotação da partícula sobre si mesma, qualquer coisa que para o planeta Terra corresponder!a ao período de vinte e quatro horas, regulando a alternância dos dias e das noites. 
Chegou-se à conclusão de que nenhuma explicação simplista deste gênero poderia manter-se em pé. O spin era simplesmente o spin, uma quantidade de energia ligada à partícula, apresentando-se matematicamente como uma rotação sem que gire, seja o que for, na partícula. (NR. - Uma torção do nada, como já disse alguém, que não me lembro).
Profundos trabalhos, devidos sobretudo ao Professor Louis de Broglie, conseguiram explicar apenas parcialmente o mistério do spin. Mas, bruscamente, descobriu-se que entre as três partículas conhecidas: prótons, elétrons, nêutrons (e as suas imagens no espelho, antipróton, pósitron, antinêutron), existia uma boa trintena de outras partículas. 
Os raios cósmicos, esses grandes aceleradores, produziam-nas em grandes quantidades. Ora, para descrever essas partículas, os quatro números habituais, massa, carga, momento magnético, spin, já não eram suficientes. Era necessário criar um quinto número, talvez um sexto, e assim indefinidamente. E foi de uma forma absolutamente natural que os físicos chamaram a essas novas grandezas "números quânticos de estranheza". Esta saudação ao anjo do Bizarro tem qualquer coisa de imensamente poético. Como muitas outras expressões da física moderna: "Luz Interdita", "Algures Absoluto", o "número quântico de estranheza" prolonga-se para além da física, e tem ligações com as profundezas do espírito humano. 
Peguem uma folha de papel. Façam-lhe dois buracos pouco distanciados. Aos olhos do senso comum, - é evidente que um objeto suficientemente pequeno para passar através desses buracos passará quer por um, quer por outro. Aos olhos do senso comum, um eléctron é um objeto. Possui um peso definido, produz um clarão luminoso quando impressiona uma tela de televisão, um choque quando atinge um microfone. Temos portanto o nosso objeto suficientemente pequeno para passar por um dos dois buracos. Ora, a observação pelo microscópio eletrônico mostra que o eléctron passou simultaneamente pelos dois buracos. Como?! Se passou por um, não pode ter passado ao mesmo tempo pelo outro! Mas a verdade é que ele passou por um e por outro. É absurdo, mas é experimental. 
Das tentativas de explicações nasceram diversas doutrinas, em particular a mecânica ondulatória. Mas a mecânica ondulatória, entretanto, não consegue explicar totalmente um fato semelhante, que se mantém para além das nossas possibilidades de compreensão, a qual só poderá funcionar através de um sim ou um não, A ou B. Era a própria estrutura do nosso entendimento que seria necessário modificar, para que se pudesse compreender. A nossa filosofia exige tese e antítese. É preciso acreditar que, na filosofia do elétron, tese e antítese são simultaneamente autênticas. Parecerá absurdo o que dizemos? O elétron parece obedecer a leis, e a televisão, por exemplo, é uma realidade. 
O eléctron existe ou não? Aquilo que a natureza chama existir não tem existência a nossos olhos. O eléctron faz parte do ser ou do nada? Eis uma pergunta completamente vazia de sentido. Assim desaparecem, devido à ação enérgica do conhecimento, os nossos habituais métodos de pensamento e as filosofias literárias, provenientes de uma visão caduca dos fatos. 
A Terra está ligada ao Universo, o homem não está em contato apenas com o planeta em que habita. Os raios cósmicos, a radioastronomia, os trabalhos de física teórica revelam contatos com a totalidade do cosmo. Já não vivemos num mundo fechado: um espírito verdadeiramente testemunha da sua época não o poderia ignorar. Nessas condições, de que forma pode o pensamento no plano social, por exemplo, continuar preocupado com problemas que nem sequer são planetários, mas estritamente regionais, provinciais? E como pode a nossa psicologia, tal como se exprime no romance, manter-se tão fechada, reduzida aos movimentos infraconscientes da sensualidade e do sentimentalismo? Enquanto milhares de seres civilizados abrem livros, vão ao cinema ou ao teatro para saber de que maneira Françoise se sentirá impressionada por René e como, por outro lado, odeia a amante do pai e se tornará lésbica por surda vingança, vários investigadores, que fazem com que os números entoem uma música celeste, perguntam a si próprios se o espaço se contrai ou não em redor de um veículo espacial. Nesse caso todo o Universo se tornaria acessível: haveria possibilidades, durante o espaço de uma vida humana, de atingir a estrela mais longínqua. Se tais equações fossem confirmadas, o pensamento humano seria alterado. Se o homem não está limitado a esta Terra, novas interrogações terão de fazer-se a respeito do sentido profundo da iniciação e dos eventuais contatos com inteligências do Exterior. 
Em que ponto estamos ainda? Em matéria de pesquisa sobre as estruturas do espaço e do tempo, as nossas noções de passado e de futuro já não servem. Ao nível da partícula, o tempo circula simultaneamente nos dois sentidos: futuro e passado. A uma velocidade extrema, limite da velocidade da luz, o que é o tempo? 
Estamos em Londres, em outubro de 1944. Um foguete V2, voando a 5000 quilômetros por hora, está sobre a cidade. Ele vai cair. Mas esse "vai" se aplica a quê? Para os habitantes do prédio que será destruído dentro de instantes, e que apenas possuem olhos e ouvidos, o V2 vai cair. Mas para o operador de radar, que se serve de ondas que se propulsionam a 300 mil quilômetros por segundo (velocidade em relação à qual o foguete é uma lesma), a trajetória da bomba já está fixada. Ele observa: mas não pode fazer coisa alguma. Na escala humana, já nada pode interceptar o instrumento de morte, nem evitar seja o que for, Para o operador o foguete já caiu. À velocidade do radar, praticamente o tempo não corre. Os habitantes do prédio vão morrer. No super-olho do radar já estão mortos. 
Outro exemplo: encontram-se nos raios cósmicos, quando estes atingem a superfície da Terra, algumas partículas, os mésons mu, cuja vida sobre o globo não ultrapassa um milionésimo de segundo. Ao fim desse milionésimo de segundo destroem-se a si próprios por meio da radioatividade. Ora, essas partículas nasceram a 30 quilômetros no céu, região onde a atmosfera do nosso planeta começa a ser densa. Para transpor esses 30 quilômetros, elas já ultrapassaram o seu tempo de vida, considerado segundo a nossa escala. Mas o seu tempo não é o nosso. Elas viveram essa viagem na eternidade e apenas entraram no tempo depois de perdida a sua energia, ao chegar ao nível do mar. Prevê-se a construção de aparelhos nos quais se produziria o mesmo efeito. Criar-se-ia desta forma uma espécie de gavetas do tempo, onde estariam arrumados objetos de fraca duração, conservados na quarta dimensão. Essa gaveta seria um anel oco de vidro, colocado num enorme campo de energia e onde as partículas rodariam com tal velocidade que para elas o tempo teria praticamente deixado de correr . Desta forma, uma vida de um milésimo de segundo poderia ser mantida e observada durante minutos ou horas ... 
"Não se deve acreditar que o tempo decorrido regressa ao nada: o tempo é uno e eterno, o passado, o presente e o futuro não passam de aspectos diferentes - gravuras diferentes se se preferir - de um registro contínuo e invariável da existência perpétua. " Para os discípulos atuais de Einstein, apenas existiria realmente um eterno presente. Era o que os antigos místicos diziam. Se o futuro já existe, a preconização é um fato. Toda a aventura do conhecimento antecipado é orientada no sentido de uma descrição das leis da física, mas igualmente da biologia e da psicologia no contínuo de quatro dimensões, quer dizer, no eterno presente. Passado, presente e futuro "são". Talvez seja apenas a consciência que se desloca. Pela primeira vez a Consciência é admitida sem discussão nas equações de física teórica. 
Neste eterno presente, a matéria surge como um delgado fio estendido entre o passado e o futuro. Ao longo desse fio desliza a consciência humana. Por que meios é ela capaz de modificar as tensões desse fio, de forma a controlar os acontecimentos? 
Saberemos um dia e então a psicologia fará parte da física. 
A liberdade é provavelmente conciliável com este eterno presente. "O viajante que sobe o Sena de barco sabe antecipadamente as pontes que encontrará. Nem por isso é menos senhor das suas ações, nem menos capaz de prever o que poderá acontecer inopinadamente." Liberdade de vir a ser, no centro de uma eternidade que é. Visão dupla, admirável visão do destino humano ligado à totalidade do Universo! 
Se eu pudesse recomeçar a minha vida, com certeza não escolheria ser escritor e passar os meus dias numa sociedade retardatária na qual a aventura dormita debaixo das camas, como um cão. Ser-me-ia necessária uma aventura-leão. Seria físico teórico, para viver no âmago ardente do verdadeiro romanesco. 
O moderno mundo da física desmente terminantemente as filosofias do desespero e do absurdo. Ciência sem consciência não passa de uma ruína da alma. Mas consciência sem ciência é ruína idêntica. Aquelas filosofias que atravessaram a Europa no século XX eram fantasmas do século XIX, vestidos à moda atual. 
Um conhecimento real, objetivo, de fato técnico e científico, que cedo ou tarde arrasta o fato social, ensina-nos que há uma direção nítida na história humana, um acréscimo do poder do homem, uma subida, do espírito geral, uma enorme forja das massas que as transforma em consciência ativa, o acesso a uma civilização na qual a vida será tão superior à nossa como a nossa em relação à dos animais. Os filósofos literários disseram-nos que o homem é incapaz de compreender o mundo. Já André Maurois, em Les Nouveaux Discours du Docteur O'Grady, escrevia: "Tem de admitir, no entanto, doutor, que o homem do século XIX podia acreditar que, um dia, a ciência explicaria o mundo. Renan, Berthelot, Taine, também esperavam o mesmo, no princípio da sua vida. O homem do século XX já não tem tais esperanças. Sabe que as descobertas só fazem recuar o mistério. Quanto ao progresso, constatamos que os direitos do homem só provocaram fome, terror, desordem, tortura e confusão de espírito. Que esperança resta? Para que vive, doutor?". Ora, o problema já não se colocava desta forma. Sem que os faladores se apercebessem, o círculo fechava-se à volta do mistério e o progresso incriminado abria as portas do céu. Já não é Berthelot ou Taine a fazer previsões a respeito do futuro da humanidade, mas sim homens como Teilhard de Chardin. De um recente confronto entre cientistas de diversas disciplinas sobressai a seguinte ideia: talvez um dia os derradeiros segredos das partículas elementares nos venham a ser revelados pelo comportamento profundo do cérebro, pois ele é o resultado e a conclusão das mais complexas reações na nossa região do Universo, e talvez contenha em si próprio as leis mais íntimas dessa região. 
O mundo não é absurdo e o espírito não é de forma alguma inapto para compreendê-lo. Antes pelo contrário, pode ser que o espírito humano já tenha compreendido o mundo, mas ainda não o saiba ...



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